PENSAMENTO PLURAL Brasil: desigualdades em uma democracia falha, por Palmarí de Lucena
Em sua crônica, o escritor Palmarí de Lucena lembra recente artigo de Oded Grajew, publicado na Folha de São Paulo, em que denuncia as profundas desigualdades no Brasil, uma nação com alta concentração de riqueza e injustiças estruturais. “A desigualdade econômica, racial e de gênero é perpetuada por escolhas políticas e um sistema tributário regressivo. Grajew defende mudanças para garantir justiça social e equidade”, pontua. Confira íntegra…
O artigo de Oded Grajew, publicada na Folha de São Paulo de 02 de dezembro de 2024, nos provoca a encarar a dura realidade das desigualdades no Brasil, uma nação que carrega o paradoxo de ser ao mesmo tempo a oitava maior economia do mundo e uma das mais desiguais do planeta. Suas palavras ecoam uma verdade inegável: a desigualdade brasileira não é fruto do acaso nem um resquício apenas de um passado colonial, mas o resultado de escolhas políticas e sociais que continuam a privilegiar poucos em detrimento de muitos.
No Brasil, a democracia, que deveria garantir o bem-estar coletivo, tornou-se um sistema que serve predominantemente aos interesses de uma elite econômica. Os números são estarrecedores: 1% da população detém 63% da riqueza, enquanto 40% dos brasileiros mais pobres sobrevivem com menos de R$ 150 por mês. Essa concentração absurda de renda é sustentada por estruturas políticas e econômicas que perpetuam injustiças e tornam a pobreza uma realidade intrínseca ao país.
Além da dimensão econômica, a desigualdade brasileira reflete profundas opressões de raça e gênero. Mulheres negras, por exemplo, estão entre as maiores vítimas dessa injustiça estrutural: elas ganham apenas 42% do salário de um homem branco e sofrem de forma desproporcional com a violência, representando 76,9% das mortes violentas e 83,1% das vítimas de violência policial. Isso evidencia que as desigualdades no Brasil são mais do que econômicas — elas são históricas, raciais e estruturais.
O sistema tributário brasileiro é um reflexo dessa lógica perversa. Em vez de cobrar proporcionalmente de quem tem mais, o país sustenta um modelo regressivo, com impostos pesados sobre o consumo, que penalizam os mais pobres, enquanto lucros e dividendos dos ricos seguem isentos de tributação. Essa estrutura não é neutra: ela reforça o abismo social, tornando a ascensão econômica para os mais vulneráveis quase impossível.
Como aponta Grajew, o Brasil dispõe de recursos e capacidade para reverter essas desigualdades, mas isso exige decisões políticas que priorizem a justiça social e a equidade. Infelizmente, o que vemos é um sistema político capturado por interesses econômicos, em que políticas públicas são moldadas para atender a uma minoria, deixando a maioria da população marginalizada.
A democracia brasileira, muitas vezes celebrada, está distante de seu ideal. A influência desproporcional do poder econômico em eleições e decisões políticas transforma o sistema em um teatro onde as elites ditam as regras. Assim, as promessas de um país mais justo e inclusivo, inscritas na Constituição, permanecem apenas no papel.
A verdadeira questão que devemos nos fazer é: que democracia é essa que permite tamanha desigualdade? Enquanto não priorizarmos mudanças estruturais — desde a tributação progressiva até o acesso universal a direitos básicos como saúde, educação e saneamento —, o Brasil seguirá preso nesse ciclo de injustiças.
Combatendo desigualdades, não apenas promovemos justiça social, mas também fortalecemos a coesão social, a sustentabilidade econômica e a própria democracia. A mensagem de Oded Grajew é clara: o Brasil só será verdadeiramente democrático e próspero quando a desigualdade deixar de ser uma marca tão profunda de sua identidade.
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