Autocratas eleitos democraticamente, confira com Palmarí de Lucena
Em sua mais recente crônica, o escritor Palmarí de Lucena aborda o processo de impeachment contra o presidente Trump, que evidencia um embate entre as duas casas legislativas do Congresso americano. É certo que Trump será alcançado pela Câmara, mas, no Senado, há uma maioria republicana “sincronizada impropriamente com o réu do processo”. Confira a íntegra do comentário “Autocratas eleitos democraticamente”:
O impeachment de Donald Trump, que começara como um solene exercício da democracia em busca da verdade, se há transformado em uma guerra de trincheira entre membros das duas câmaras do Congresso Americano. Julgando-se pelas narrativas de bancadas opostas, a decisão final será alcançada por maiorias partidárias, no caso do Senado, sincronizada impropriamente com o réu do processo. Subvertendo assim a função constitucional de julgar imparcialmente, ao servir de advogado de defesa do acusado, obstruindo à justiça, embaçando as linhas de separação entre os Três Poderes.
O século XX for definido pela ascensão da democracia liberal, o século XXI está sendo caracterizado pela decadência nas suas primeiras décadas. Estudo da organização “Varieties of Democracies Institute (V-Dem)”, mostra que vinte e quatro países, incluindo os EUA, enfrentaram tantos contratempos na governança dos seus sistemas, que estão se “autocratizando”. Erosão da democracia sendo comandada por lideres questionando as mesmas normas que os levaram ao poder, provocando a polarização tóxica, normalizando o ódio e dando vazão a teorias de conspiração. Estereotipando minorias e pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza como fardos econômicos, vítimas de suas próprias limitações, segundo o credo dos novos oráculos do mercado.
Donald Trump expressa antipatia pelas normas e instituições democráticas, usando sua conta do Twitter para vilificar a imprensa livre, o judiciário e o processo eleitoral, justificando outros lideres chauvinistas a agir autocraticamente. O abismo entre os interesses do povo e aqueles da elite política, motivou eleitores a optar por “novos políticos”, preparados a chacoalhar o status quo e impor uma nova ordem político-econômica. Escolhas pontuais que não consideraram a possibilidade de que desigualdades econômicas, agravadas pela pressa de implantar políticas antagonistas ao estado de bem-estar, forjassem pseudodemocracias e criassem eventualmente sérios desafios a sustentabilidade do Estado Democrático de Direito. Eis aí o grande desafio.