IRRACIONALIDADE NA PANDEMIA A guerra da cloroquina e o desserviço que se presta ao cidadão comum
Num dia, centenas de médicos subscrevem um documento recomendando o uso da cloroquina para combater a Covid-19. No outro, outros tantos divulgam abaixo-assinado condenando o uso do medicamento. Na semana passada, a OMS (Organização Mundial de Saúde) mandou suspender os estudos com a aplicação da cloroquina. Nesta quarta (dia 3), voltou atrás e já recomendou a volta dos estudos com o remédio.
Em quem acreditar? As pessoas dão crédito à medicina, mas em que médico devem acreditar, diante dessa guerra? Há pessoas que podem até não tomar estricnina, posto ser veneno, mas tomariam gasolina se estivesse com o coronavírus e o seu médico recomendasse. Porque todos estão tentando se agarrar numa tábua de salvação. É do humano se apegar a uma esperança qualquer, por menor que seja.
Esses sujeitos envolvidos nessa guerra da incerteza não poderiam prestar um maior desserviço às pessoas, num momento de pandemia e pânico. A cloroquina entrou de gaiata numa disputa político-partidária. E muitos embarcaram, depois que Bolsonaro e Trump fizeram juras de amor à cloroquina. Dois dos presidentes mais questionados (e odiados) do mundo, especialmente pelos que se imaginam de esquerda.
Uma indagação se impõe: e se Lula tivesse recomendado cloroquina, como teria sido? Depois que deu graças a Deus pela natureza ter criado o novo coronavírus, não seria de espantar que defendesse. Mas, pelo visto, cloroquina é da bandeira de uma tal direita, como chegou a dizer Bolsonaro, aliás. E o cidadão, que não é direita, nem esquerda, nem coisa nenhuma e que quer apenas salvar sua vida e se vê no meio da irracionalidade política querendo pautar sua saúde. Que lástima.
Então, a cloroquina, em vez de salvar vida, mata para aqueles contrários a uma facção política, alegando sua capacidade de provocar problemas cardíacos e que sua recomendação parte de médicos e governantes insanos. Os que são a favor, dizem que a cloroquina vem sendo combatida, por conta do poderoso lobby da indústria farmacêutica que pouco lucra com o medicamento, e vem tentando desesperadamente encontrar um remédio para a cura, que seja exponencialmente caro. Para fazer fortunas.
Sabe-se lá quem está com a razão. Talvez a gente nunca saiba, meu caro Paiakan. De minha parte, meu memória me traz lembranças de minha avó Antônia Jácome. Quando eu, meus irmãos e meus primos éramos crianças, ela nos tratava com chá de quina-quina. Uma planta muito usada pelos índios e caboclos. Dessa planta, se extrai o princípio ativo da cloroquina. Soube um dia desses.
Minha avó, no entanto, alertava para tomar na dose certa. “Demais, é veneno!”, dizia. Como aliás, tudo no mundo, inclusive esse bombardeio de informações, desinformações, notícias falsas, fake news e tudo o mais que se oferece no cardápio da Internet plantando incertezas numa guerra irracional para confundir as pessoas.
De cloroquina não sei, mas de quina-quina, pelo menos no meu tempo de criança, nunca ouvi falar que alguém morresse. Ou tivesse taquicardias. Só taquicárdicos agradecimentos pelo carinho de minha vó.