PENSAMENTO PLURAL O Mínimo cada vez mínimo, por Rui Leitão
Instituído na década de 1930, o Salário Mínimo objetivava levar dignidade aos trabalhadores, propiciando o mínimo para “atender às necessidades vitais básicas do trabalhador brasileiro e às de sua família, com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social”. Em sua crônica, o escritor e historiador Rui Leitão questiona se este imperativo constitucional vem sendo cumprido. E observa como o valor anunciado para o próximo Mínimo mostra exatamente o contrário. Confira a íntegra de seu comentário…
O Salário Mínimo é um direito social de essencial importância, tanto que está incluso em nossa Carta Magna. O seu conceito, todavia, cada vez mais se distancia da realidade. O que diz o artigo que o define como preceito constitucional? No inciso IV do artigo sétimo estabelece que o salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, deverá ser capaz de atender às necessidades vitais básicas do trabalhador brasileiro e às de sua família, com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim. Está sendo cumprida essa imposição constitucional? Todo mundo sabe que não.
A intenção utópica dos constituintes foi a de estabelecer uma remuneração mínima que garantisse a sobrevivência digna obtida pela correspondência do trabalho prestado. O fato real é que com o passar do tempo o salário mínimo vem sendo reduzido, tornando-o incapaz de suprir as necessidades básicas do trabalhador e sua família. Não consegue sequer atender à alimentação necessária. Quem vive do salário mínimo vive em estado de pobreza. A condição social da população brasileira piora a cada ano, considerando que os reajustes do salário mínimo não preservam o seu poder aquisitivo. Pelo contrário, reduzem a serventia para atendimento dos atributos necessários para garantia da subsistência humana digna.
Instituído na década de 30, só veio a ter o primeiro reajuste em 1943. Decorreram oito anos para que um novo reajuste voltasse a acontecer. A partir de 1962, com a aceleração da inflação, o salário mínimo foi perdendo o seu poder de compra. A ditadura militar modificou a política de reajustes, não permitindo a recomposição do seu valor real. Verificou-se nesse período uma acelerada queda salarial resultante da subestimação da inflação por parte do governo. Esse ganho real, porém, voltou a acontecer a partir de 1975 até 1982, na ordem de trinta por cento. Todavia, após esse período, até 1990, o valor real do salário mínimo sofreu uma redução de vinte e quatro por cento. Nessa época ele foi unificado em todo o território nacional, pois era determinado conforme as regiões em que viviam os trabalhadores. Com a estabilização do Plano Real, o salário mínimo teve ganhos reais, calculados em 28 por cento. Em 2007 foi implantada a política chamada de “aumentos reais”, levando em conta não só a inflação do ano, mas também o quanto ele precisaria aumentar para a população não perder seu poder de compra e ter o dinheiro valorizado. Até janeiro de 2013 os reajustes foram sempre acima da inflação. A partir de então registraram-se reajustes equivalentes ou inferiores à inflação.
Observa-se, então, a interrupção do processo de resgate do valor histórico da remuneração mínima do trabalhador brasileiro. Desprezam a sua importância fundamental na expansão da demanda interna, através do seu impacto positivo sobre o nível de consumo das famílias. É desconsiderado como instrumento de redução da pobreza e das desigualdades sociais. Até abril deste ano a previsão era de que teríamos um salário mínimo fixado em R$ 1.079,00 para janeiro de 2021. A última notícia é de que o governo já trabalha com a proposta de um valor reduzido para R$ 1.067,00, sem aumento real pelo segundo ano consecutivo. Em síntese, o “mínimo fica da vez mais mínimo”.
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