PENSAMENTO PLURAL Marco Antônio Maciel: um iluminado político de estirpe, por Francisco Barreto
O economista, escritor e professor doutor Francisco Barreto brinca os leitores com um belo texto sobre Marco Maciel, “habilíssimo articulador político, cultivava a discrição, e a modéstia nas exitosas incursões, sobremodo, nas lides eleitorais”. Barreto lamenta, em sua crônica, o recente falecimento de Marco Maciel, e pontua como, “numa hora tão desastrosa nesta Nação, falece a dignidade, a grandeza politica de homens públicos democratas e republicanos”. Confira a íntegra de seu texto…
Em meados de Dezembro de 1978, pelas mãos de Everardo Maciel fui apresentado a Marco Maciel, eleito Governador de Pernambuco pela via indireta. Everardo, coordenador da equipe de Governo em tom de blague, me apresentou ao Governador lhe impactando com a seguinte frase: – Marco, lhe trago Francisco Barreto, paraibano e comunista, para ingressar na nossa equipe de governo -… Calmo, e educado, me olha: – O seu matiz ideológico pouco importa seja benvindo ao nosso Governo. Se sinta acolhido. Agradeci, e lhe disse – Governador, – Everardo foi longe demais, não sou, nunca fui comunista sou apenas economista e carbonário. Ele sorriu, e me declarou uma indisfarçada afeição pela Paraíba, arrematando me disse – D. Carmem, minha mãe é do vale do Piancó, sua conterrânea.
Marco Antônio, era uma pessoa educada, calma, sorridente, uma figura pública exemplar. Ao longo de alguns poucos anos, em que convivi com ele, aprendi a admirá-lo sempre pude confirmar a impressão de que se tratava um liberal iluminado afável, discreto e democrata convicto. Logo no primeiro momento, secundado por Ana Maria, a esposa, Me disser – quero conversar com você sobre a política na França -. Declinou especial interesse em ter minha opinião sobre Pierre Mendès-France e Giscard d´Estaing , personagens pelos quais tinha grande admiração.
Marco Antônio, apesar de ser qualificado como um politico de direita nunca se sentiu à vontade pelas suas ligações com a Ditadura. Apesar dos importantes cargos ocupados na estrutura de poder militar soube de maneira exemplar se resguardar à sombra de sua vocação social democrática. Como Governador, tinha uma discreta e respeitosa relação com a esquerda pernambucana, e por isto sempre fora reconhecido e reverenciado. Era um homem público habilidoso percorrendo as trajetórias do diálogo, conciliador ao que sempre demonstrou na sua vitoriosa vida política. Em toda sua existência, nunca houve nenhuma mácula moral que o remeta à desonra e à indignidade enquanto gestor público extremamente honesto.
Habilíssimo articulador político, cultivava a discrição, e a modéstia nas exitosas incursões, sobremodo, nas lides eleitorais. Em 1982 liderou com Gustavo Krause um feito extraordinário uma dolorosa derrota eleitoral a Marcos Freire, inclusive, em volumosas áreas do Recife. As esquerdas que, durante anos consideravam Marcos Freire imbatível, foram combalidas por um candidato reacionário, desprestigiado e rancoroso como Roberto Magalhães, ex-vice de Marco Antônio. Perderam feio. Marco Antônio em sua profunda modéstia nunca se vangloriou daquela estupenda vitória.
Foi um importante sustentáculo se distanciando da Ditadura, ao dar apoio à redemocratização, galvanizando determinado apoio das hordas sociais liberais, que, equivocadamente sempre foi alcunhada de fascistas. O Dr. Ulysses, spalla da democracia republicana, reconheceu em Marco Antônio a extrema habilidade política, correção e determinação de Marco Antônio Maciel. O mesmo Ulysses Guimarães tinha uma particular predileção em admitir o mesmo como Vice de Tancredo Neves.
Testemunhei, e fui alvo da retidão liberal e democrática de Marco Antônio que me abriu as portas das funções públicas em Pernambuco ao me nomear para SEPLAN-PE, na condição de Adjunto e Coordenador Geral de Planejamento. Tive a honra de ter estado no seu governo.
Passei longos anos, alvo da Ditadura, exilado inclusive impedido de exercer qualquer função publica a conta dos crivos do SNI. Assim foi na UFRJ/FAU, SEPLAN-PR/IPEA/IPLAN, UNB/MDR UFPE/FAU/MDU. Foram nove anos de excludência sem condenações
Marco Antônio, com sua nobre atitude em me acolher me restaurou a condição de cidadão apto, e qualificado para o serviço publico. Muitos outros tiveram a generosidade, e a indulgência politica daquele republicano governante. Em todo o seu Governo não permitiu perseguição politica, e sempre agiu com extrema prudência e dignidade com os movimentos sociais reivindicativos e contestatórios numa época em que a repressão ainda estava intocável pelo radicalismo ditatorial. No Palácio do Campo das Princesas recebia todas as representações populares. Roberto Magalhães foi inflexível e perseguidor. Inaugurou um estilo de Governo às avessas, demitia sem consideração os Secretários de Marco Antônio que tivesse equilíbrio democrático. Vários, que por acaso tivesse tido proximidade com as esquerdas, Everardo Maciel, das Finanças de modo odiento foi o primeiro deles.
Sempre destinei a Marco Antônio Maciel as minhas mais elevadas reverencias e gratidão. De uma delicadeza impar, muitos anos depois quando o encontrava, me dirigia a palavra – Barreto, me procure quero conversar com você. O seu DNA pessedista, herdado do pai José do Rego Maciel, Prefeito do Recife e, de seu padrinho Etelvino Lins, se dirigia a todos respeitosamente os invocando pelo nome. Memória prodigiosa ele a tinha.
Era prodigiosa a capacidade de trabalho gestor Marco Antônio. Com crise ou não hesitava em convocar seus auxiliares para reuniões e despachos em alta madrugada. Não conciliava o sono enquanto não resolvesse qualquer pendência. Éramos convocados em qualquer hora da madrugada. Uma vez fui convocado em plena noite de Natal, abandonei a família, e rumei para o Campo das Princesas. Fora me dado uma tarefa dificílima. Preparar uma exposição sobre o estratégias e programas para o setor agrícola do novo Governo. Fui escalado para uma tarefa dificílima expor para o Ministro da Agricultura Delfim Neto. O fiz. Se desculpando, humildemente o Governador me agradeceu dizendo que tivera êxito. Fora no dia do meu aniversário. Recebi como um presente no dia do meu aniversário.
Com a morte de Marco Antônio Maciel, numa hora tão desastrosa nesta Nação, falece a dignidade, a grandeza politica de homens públicos democratas e republicanos. É uma lástima para Brasil, e em especial o Estado de Pernambuco. Que pena.
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