PENSAMENTO PLURAL Aprendendo a conviver com a Covid-19, por Palmarí de Lucena
O escritor Palmarí de Lucena observa, em sua crônica, como o achatamento da curva de contágio pelo novo coronavírus, há a possibilidade de desafogar os hospitais e ganhar tempo “para imunizar pessoas ainda não vacinadas, relutantes ou necessitando reforço, incluindo crianças”. Mas, é improvável que o vírus “zere imunidade, respostas imunes são tão complexas, o que impossibilita o vírus de escapar de todas elas”. Confira a íntegra de seu comentário…
Endemicidade aparenta ser mais palpável na medida em que o fim da pandemia se apresenta como uma possibilidade real, embora um marco definitivo ainda seja inimaginável ou mesmo ausente nas projeções mais otimistas. Eventualidade de uma Covid-19 endêmica, não pode ser considerada nem um prenúncio, nem a luz verde para o relaxamento de medidas não farmacológicas. Quanto mais achatarmos a curva de contágio, mais desafogamos hospitais e ganhamos tempo para imunizar pessoas ainda não vacinadas, relutantes ou necessitando reforço, incluindo crianças.
Permitir que o vírus continue contaminado os não vacinadas como a maneira mais rápida de alcançar endemicidade, é uma abordagem com o potencial de causar aumento no número de óbitos ao longo de sua trajetória, como já demonstrado na equivocada estratégia de imunidade de rebanho, defendida sem respaldo científico e com motivação ideológica, por altas autoridades brasileiras. É difícil imaginar o futuro enquanto as UTIs são reocupadas, como uma consequência direta do surto da variante Delta.
Com a maioria da população ainda vulnerável a infecção, o vírus tem inúmeras oportunidades de mutações em novas variantes, propagando-se e aumentando infecção de pessoas de um amplo espectro de faixas etárias. É improvável que este vírus zere imunidade, respostas imunes são tão complexas, o que impossibilita o vírus de escapar de todas elas, segundo a Dra. Sarah Cobey da Universidade de Chicago. A imunidade contra infecção pode diminuir sem comprometer proteção contra doenças graves ou óbitos, o objetivo inicial das vacinas contra a Covid-19.
Eficazes em induzir imunidade nos pulmões, vacinas contra vírus respiratórios raramente protegem contra infecção generalizada, as vias nasais são o trampolim para a entrada de vírus no sistema respiratório. Segundo a Dra. Ruth Karron da renomada Johns Hopkins University, o extraordinário resultado dos testes clínicos de algumas vacinas, como a Pfizer e a Moderna, revelaram uma eficácia de 95 por cento contra infecções sintomáticas, criaram expectativas irrealistas de uma possível eliminação do contágio por Covid-19 nos Estados Unidos, como no caso do sarampo ou caxumba.
Transição para a Covid-19 endêmica é também psicológica. Quando todos alcançarem alguma imunidade, o diagnóstico da doença se transformará em algo tão mundano como o da gripe ou da faringite estreptocócica. Aprendizado e conscientização que a Covid-19 não é uma “gripezinha” como outra qualquer, podem se perder no turbilhão de diretivas contraditórias sobre quando e como abolir o uso de máscara ou relaxar medidas não farmacológicas. No caso da gripe comum, estamos preparados para aceitar os riscos inerentes a doença. Infelizmente, ainda não concordamos como prosseguir sobre a Covid-19 ou de encontrarmos uma nova e tolerável maneira de conviver com este vírus.
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