Em sua crônica, o escritor Palmarí de Lucena destaca a importância do Oscar de melhor filme estrangeiro para “Ainda estou aqui”, de Walter Salles. “Rompeu barreiras, desafiou prognósticos, e, ao derrotar o favorito Emília Pérez, inscreveu seu nome entre as grandes narrativas do nosso tempo”, pontua, Confira íntegra…
A noite do Oscar 2025 entrou para a história como um marco incontornável do cinema brasileiro. Pela primeira vez, um filme nacional conquistou a estatueta de Melhor Filme Internacional, uma consagração tardia, mas absolutamente merecida. Ainda Estou Aqui, de Walter Salles, rompeu barreiras, desafiou prognósticos e, ao derrotar o favorito Emilia Pérez, inscreveu seu nome entre as grandes narrativas cinematográficas do nosso tempo.
A surpresa da vitória ecoou pela imprensa internacional. A Variety descreveu o feito como “chocante”, considerando que Emilia Pérez acumulava impressionantes 13 indicações, contra apenas três do concorrente brasileiro. A People, por sua vez, apontou o resultado como inesperado, mas também como um motivo de orgulho para o Brasil. No Guardian e no New York Times, o reconhecimento foi além: Ainda Estou Aqui não apenas encantou como obra cinematográfica, mas também provocou reflexões sobre o impacto da ditadura militar no país, traçando paralelos com um mundo cada vez mais assombrado por regimes autoritários e retrocessos democráticos.
Em tempos em que o passado insiste em assombrar o presente, em que os fantasmas da repressão ressurgem com novas roupagens, o cinema se torna um campo de batalha simbólico. A história de Ainda Estou Aqui não é apenas uma narrativa do Brasil; é um grito global, um espelho das dores de povos que lutam contra o esquecimento e a distorção de suas memórias. Ao dar voz a uma história de resiliência e justiça, Walter Salles ofereceu ao mundo um lembrete incômodo, mas necessário: não se pode sepultar o passado sem antes enfrentá-lo.
Mas não foi apenas o filme que brilhou. Fernanda Torres, indicada a Melhor Atriz, desfilou pelo tapete vermelho como um símbolo do talento e da força do cinema brasileiro. Mesmo sem levar a estatueta, sua presença foi descrita como “encantadora” pela Hollywood Reporter, que ressaltou sua atuação magistral e sua elegância arrebatadora. Mais do que um prêmio, Fernanda Torres ganhou o respeito e a admiração de um público global, que passou a olhar para o Brasil com olhos renovados.
A vitória de Ainda Estou Aqui ultrapassou os limites do Dolby Theatre e reverberou no coração do Brasil. No Sambódromo do Rio de Janeiro, onde os desfiles de Carnaval seguiam seu curso, o resultado foi anunciado para milhares de espectadores, que explodiram em euforia. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva celebrou a conquista como um momento de orgulho nacional, reafirmando a importância da arte na construção da identidade brasileira.
O cinema brasileiro, tantas vezes subestimado e ignorado, mostrou ao mundo que tem histórias potentes a contar. Ainda Estou Aqui abriu uma porta que já fora entreaberta por Central do Brasil e Cidade de Deus, mas que agora escancara novas possibilidades para uma geração de cineastas comprometidos em dar voz ao Brasil real. Mais do que uma premiação, essa vitória é um manifesto: o cinema é memória, o cinema é resistência, o cinema é futuro.
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