PENSAMENTO PLURAL Poço das Pedras: onde o tempo descansa com a alma, por Palmarí de Lucena

Texto do escritor Palmarí de Lucena revela, com intensidade poética, um dos locais mais incríveis da Paraíba. O Poço das Pedras, em São João do Cariri, “um lugar onde a vida parece andar de alpargatas e o céu veste estrelas sem pressa”.  E ainda: “Um abrigo de memória e silêncio, onde o tempo repousa com respeito e as paredes centenárias acolhem cada visitante como se fosse da casa”. Confira íntegra…

Foi no sopé de um tempo antigo, lá pelas bandas do Cariri paraibano, que encontrei um lugar onde a vida parece andar de alpargatas e o céu veste estrelas sem pressa. A casa, nascida em 1914, ergue-se com a serenidade de quem já viu muito- e ainda acolhe mais.

No Cariri paraibano, 

Sertão forte e resistente, 

Surge a casa centenária 

Com alicerce imponente…

Chegamos ao meio-dia, e acompanhamos com emoção a chegada da luz dourada que tocava suavemente as paredes grossas da Fazenda Poço das Pedras – como quem acaricia a história. À nossa espera, hortaliças orgânicas, frutas colhidas ali mesmo e um forno a lenha que anunciava, sem pressa, pizzas de massa natural e conversas que durariam até que a lua se tornasse confidente.

Enquanto o forno crepitava e os cheiros da cozinha antiga se espalhavam pelo ar, a noite se aproximava silenciosa. Não era escuridão – era palco. Um céu tão estrelado que até os sonhos pareciam querer pousar por ali.

O dia é pra caminhar, 

Ou montar no cavalar,

Conhecendo o que há de belo, 

Sem pressa pra se cansar.

E à noite, sob o luar, 

Vê-se o tempo repousar.

Na casa principal, seis casais se acomodam com conforto e charme rústico. Para os mais reservados, há três suítes externas – cercadas de silêncio e estrelas — com ventilador de teto, chuveiro quente e a impressão constante de que o tempo foi desacelerado de propósito.

Durante o dia, as opções dançam diante dos olhos como folhas levadas pelo vento: trilhas em meio à caatinga viva, banhos de rio ou açude (quando a natureza permite), cavalgadas em passo de marcha, jogos, churrasco, um forró pé-de-serra ou um luau que ecoa violas em torno da fogueira.

Paredes de barro e pedra, 

Cobertas por telha antiga, 

Guardam histórias de amores, 

De fé, de luta e fadiga…

E entre pizzas e estrelas, 

A alma se abriga.

E se o viajante desejar ir além, há um convite sussurrado pelo vento: conhecer São João do Cariri, cidade-mãe do sertão, onde os casarios e igrejas guardam séculos de fé, resistência e sabedoria popular. Ali, passado e presente se cumprimentam com respeito.

Mais adiante, como quem se revela apenas aos olhos atentos, a Muralha do Meio da Terra se ergue em silêncio. Monumento geológico e poético, ela é testemunha do mundo antes do mundo. Pedra sobre pedra, curva sobre tempo, esconde segredos que nem mesmo o tempo quis levar.

A muralha desafia

Todo saber da razão.

Será rastro de gigantes?

Será sinal da criação?

No meio da terra pulsa, 

A alma do coração.

Mas o que mais impressiona não se encontra no cardápio ou nas paredes: é o sentimento de pertencimento. A cada passo pela fazenda, temos a impressão de estar reencontrando algo perdido

— talvez uma versão mais leve de nós mesmos.

A Fazenda Poço das Pedras oferece um reencontro com o essencial. E como dizem os versos que me acompanharam por lá:

A casa do Poço resiste,

 E em cada canto, socorre.

Mesmo que o tempo avance,

Mesmo que a memória escorre…

Ali, tudo ganha sentido, 

E até o silêncio tem voz.

Venha com botas — porque os caminhos do Cariri são de pedra, de terra quente, de trilha viva entre mandacarus e lajedos antigos. Mas venha, sobretudo, com a alma descalça. Porque aqui, no sertão encantado da Paraíba, é o coração quem guia os passos.

A Fazenda Poço das Pedras não é apenas uma hospedagem: é um abrigo de memória e silêncio, onde o tempo repousa com respeito e as paredes centenárias acolhem cada visitante como se fosse da casa. Lá, o forno a lenha crepita histórias, o céu se despeja em estrelas e a lua, generosa, vigia os caminhos como quem conhece os segredos da terra.

E então, entre a pedra e o poço, entre o aboio e o forró, entre o silêncio da caatinga e o sussurro das lendas, você descobre a poesia. Não aquela que se lê nos livros — mas a que pulsa sob seus pés, a cada passo que dá.

 

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