O novo mandato de Trump inaugurou uma era de conflitos entre o público e o privado. “De presentes milionários a moedas digitais personalistas, passando pela suspensão de leis anticorrupção, consolidam-se práticas que confundem Estado e governante”, pontua o escritor Palmarí de Lucena, em seu comentário e ainda: “Silencia a extrema direita, grita com complacência. Resta ao cidadão atento exigir integridade onde a opacidade se tornou norma disfarçada de força”. Confira íntegra…
O retorno de Donald Trump à presidência em 2025 reacendeu debates sobre os limites entre o interesse público e o ganho pessoal no exercício do poder. Diversos episódios recentes levantam preocupações legítimas sobre a integridade institucional e o respeito às regras democráticas, independentemente de visões ideológicas.
Um dos casos mais simbólicos envolve a aceitação de um luxuoso Boeing 747-8, avaliado em cerca de 400 milhões de dólares, oferecido pela família real do Catar. A aeronave, apelidada de “palácio voador”, foi apresentada como um presente pessoal a Trump. Juristas e analistas alertam que a medida fere a Constituição dos Estados Unidos, que exige a aprovação do Congresso para a aceitação de presentes de governos estrangeiros. O gesto reacendeu dúvidas sobre até que ponto interesses privados podem interferir em decisões públicas.
Outro ponto de atenção é o crescimento de negócios ligados ao ex-presidente na área de criptomoedas. Moedas digitais como a $TRUMP são promovidas como forma de obter acesso exclusivo a eventos e benefícios associados à sua figura pública. Isso levanta suspeitas de que o prestígio do cargo esteja sendo explorado comercialmente, o que poderia configurar uma forma indireta de favorecimento.
Além disso, uma ordem executiva assinada em fevereiro suspendeu por seis meses a aplicação da Lei de Práticas de Corrupção no Exterior (FCPA), sob o argumento de fortalecer a competitividade das empresas americanas. Para muitos especialistas, a suspensão dessa lei fragiliza os mecanismos de combate à corrupção transnacional e sinaliza uma tolerância perigosa com práticas eticamente questionáveis.
Esses acontecimentos estão alinhados ao chamado “Projeto 2025”, um plano de reestruturação governamental que busca centralizar poderes no Executivo, reduzir a autonomia de agências reguladoras e nomear aliados leais para cargos-chave. Em poucos meses, boa parte dessas diretrizes já foi colocada em prática, o que preocupa setores que defendem o equilíbrio institucional como pilar do sistema democrático.
Chama atenção, neste cenário, o silêncio da extrema direita, que costuma denunciar a corrupção com veemência quando se trata de seus adversários, mas adota uma postura de complacência — ou mesmo de cegueira deliberada — diante de governos autoritários que compartilham de sua visão ideológica. A seletividade no combate à corrupção mina a credibilidade do discurso moralizante e enfraquece a coerência dos que dizem defender a ética na política.
Em resumo, as ações recentes da atual administração indicam uma tendência de enfraquecimento das salvaguardas contra a corrupção e de flexibilização de regras projetadas para proteger o interesse público. Não se trata apenas de uma questão partidária, mas de responsabilidade administrativa e respeito à transparência. O desafio que se impõe é o de fortalecer os mecanismos de controle e assegurar que a confiança no poder público não seja corroída por práticas que confundem o que é do Estado com o que é do governante.
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