Em mais uma carta apócrifa, o escritor Palmarí de Lucena traz um imaginário texto de Niccolò Machiavelli sobre como “nas empresas familiares, a negligência com a sucessão transforma legados em ruínas”. O mesmo vale para segmentos políticos: “Ao evitar o surgimento de novos nomes, Lula e Biden provocam a estagnação. E num mundo em que a política exige movimento, estagnar é morrer.” Confira íntegra…
No mundo dos negócios e da política, a ausência de sucessores não é apenas uma fraqueza — é um risco letal. Maquiavel já advertia: a fortuna favorece os audazes, mas é a virtù que sustenta o poder. Um príncipe que não forma discípulos sela o próprio fim. Nas repúblicas modernas, onde o nome mudou mas a essência do poder permanece, a lição continua válida.
Nas empresas familiares, a negligência com a sucessão transforma legados em ruínas. Fundadores carismáticos, ao centralizar tudo em si, criam fortalezas de barro. Quando partem, levam consigo a bússola. O império desmorona — sem barulho, sem combate, sem herdeiros.
Na política, o cenário é ainda mais dramático. A ausência de sucessão legítima abre espaço ao caos. Quando os governantes envelhecem sem preparar substitutos, a república adoece. E nessa brecha surgem os aventureiros, os profetas do ressentimento, os que exploram o medo e a ignorância como armas.
Joe Biden e Luiz Inácio Lula da Silva repetem um erro primitivo: governam como se fossem eternos. Usam a ideia de “defesa da democracia” como escudo, mas não como ferramenta de renovação. Biden calou seu próprio partido ao insistir em uma candidatura cuja força reside apenas na comparação com o passado. Lula, por sua vez, reina cercado por figuras exauridas — rostos familiares, mas sem apelo. Ambos rejeitam a sucessão como quem teme a própria sombra.
Maquiavel nos ensinou que o príncipe deve moldar o tempo ou será moldado por ele. Ao evitar o surgimento de novos nomes, Lula e Biden provocam a estagnação. E num mundo em que a política exige movimento, estagnar é morrer. Não há nada mais perigoso para uma democracia do que líderes que se tornam pontes para lugar algum.
O vácuo deixado por essa omissão é preenchido por espectros. Donald Trump ressurge — não por força própria, mas porque os moderados hesitam. Bolsonaro, mesmo inelegível, ainda dita o ritmo de uma direita órfã de ideias. É a política dos fantasmas: líderes vencidos que comandam, sucessores ausentes que se curvam.
E o povo? Para o povo, “democracia” é palavra sem carne. Não alimenta, não protege, não inspira. Maquiavel diria que o governante sábio deve parecer virtuoso, mas também entregar resultados. Quando não há pão, nem ordem, nem honra, o discurso democrático se torna ruído. Uma moral ilustrada, incapaz de confrontar a brutalidade da realidade.
O príncipe que ama a estabilidade deve cultivar sucessores. Não por generosidade, mas por estratégia. É assim que se perpetua a ordem, mesmo na ausência do fundador. A história é clara: empresas quebram. Repúblicas sem sucessores podem não quebrar de imediato — mas apodrecem por dentro.
Niccolò Machiavelli
Funcionário público, diplomata, escritor e pensador político da República Florentina (Itália)
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