PENSAMENTO PLURAL Carta apócrifa do senador Ruy Carneiro à Câmara Municipal de João Pessoa, por Palmarí de Lucena

Na carta apócrifa concebida por Palmarí H. de Lucena, o senador Ruy Carneiro adverte: a política é dever, não vitrine. Critica o excesso de honrarias, a fuga do debate e a ausência de coragem para enfrentar os problemas reais de João Pessoa. Relembra que a história cobra — e o povo, cedo ou tarde, responde. Confira íntegra…

(Sobre o valor da política local e o dever de servir à cidade com decência)

Senhores Vereadores da capital paraibana,

Escrevo-vos com o peso sereno de quem percorreu o caminho que hoje trilhastes. Fui vereador, deputado, senador — mas nunca deixei de ser, antes de tudo, pessoense convicto, médico do povo, cidadão atento à dor e à dignidade da cidade onde o sol nasce primeiro.

Permitam-me, pois, um alerta fraterno: o mandato não é trono, é tarefa. E a Câmara Municipal não foi feita para condecorações em série, mas para confrontar os problemas reais — aqueles que não cabem em comendas, mas pesam no corpo do povo: a espera na UPA, o buraco na rua, o ônibus que não passa, a escola que não ensina.

A política, meus senhores, é serviço. E quando vira autopromoção, degenera em espetáculo vazio. O povo, embora cansado, não é ingênuo: sabe distinguir quem trabalha de quem apenas figura. E embora silencioso, cobra — cedo ou tarde.

Lamento ver que esta Casa, outrora tão ativa nos grandes temas da cidade, ora se perde em rotinas burocráticas e gestos simbólicos destituídos de substância. A distribuição indiscriminada de honrarias transforma o gesto nobre em moeda banal. A ausência de debate público revela não prudência, mas fuga. E o excesso de projetos irrelevantes encobre a falta de coragem para tocar nas feridas abertas da cidade.

Recordo que, em meus dias nesta Casa, a honra estava na escuta, e não na foto; no embate de ideias, não na conveniência das alianças. A cidade precisa de homens e mulheres que a defendam com coragem, não de silhuetas políticas em busca de curtidas.

Se hoje vos falo da eternidade da memória cívica, é para lembrar que ninguém passa ileso pela história. Ela cobra, registra e, um dia, devolve ao povo o julgamento que ele talvez tenha adiado.

João Pessoa precisa — e merece — uma Câmara altiva, propositiva, ética e presente. E cada um de vós tem a chance de restaurar essa imagem. Basta lembrar que a política, como a medicina, se exerce com mãos limpas, olhos abertos e coração inteiro.

Com respeito,
Ruy Carneiro
Médico, ex-vereador, senador da República — e eterno servo da cidade que me ensinou o valor da decência pública

 

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