PENSAMENTO PLURAL A Quinta-coluna à brasileira: cúmplices da humilhação nacional, por Palmarí de Lucena

Em seu comentário, o escritor Palmarí de Lucena aponta como o Brasil enfrenta ameaças externas e internas à democracia. “Trump usa tarifas e chantagens para humilhar e pressionar, enquanto uma quinta-coluna nacional difunde mentiras e a teoria infundada de um “Estado profundo” criada nos Estados Unidos, sem evidências cabíveis”, postula Palmarí. E ainda: “Inspirada no trumpismo, articulou o 8 de janeiro. Defender a soberania exige enfrentar a humilhação externa e neutralizar a traição interna.” Confira íntegra…

Não se enganem: o maior perigo à democracia brasileira não está apenas nas ameaças que cruzam nossas fronteiras, mas na traição que se instala dentro delas. Enquanto Donald Trump e seu círculo usam tarifas e chantagens para humilhar países e subjugar governos, uma rede bem enraizada em solo nacional trabalha dia e noite para entregar o Brasil a esse projeto autoritário estrangeiro. Vestem-se de verde e amarelo, mas agem como funcionários de um balcão de submissão. Chamam-se “patriotas”, mas carregam no bolso a bandeira de outro país. Falam em “liberdade de expressão” e “defesa da democracia”, mas essas palavras, em suas bocas, são apenas disfarces para destruir ambas.

O Brasil vive hoje sob a sombra de uma ameaça que se projeta de fora para dentro, mas que encontra aqui, em solo nacional, terreno fértil e operadores dedicados. Não é apenas a pressão externa de governos autoritários como o de Donald Trump que compromete a soberania. É, sobretudo, a ação persistente de uma quinta-coluna brasileira que atua em perfeita sintonia com o trumpismo e com as Big Tech, distorcendo fatos, espalhando mentiras e blindando politicamente aqueles que, em 8 de janeiro, tentaram destruir a democracia.

A história recente não deixa dúvidas sobre a origem e a evolução dessa engrenagem. Em 2018, a vitória de Jair Bolsonaro, turbinada por uma avalanche de fake news disseminadas via WhatsApp e redes sociais, marcou o início de uma aliança explícita com a direita radical norte-americana. Trump, já instalado na Casa Branca, estreitou laços com políticos e comunicadores brasileiros, estabelecendo uma ponte ideológica baseada no populismo autoritário, no ataque às instituições e na manipulação digital em escala industrial.

O ano seguinte consolidou a rede. Eduardo Bolsonaro aproximou-se formalmente de Steve Bannon, integrando a “The Movement”, uma organização global de extrema direita criada para articular campanhas e narrativas comuns entre seus membros. Influenciadores bolsonaristas, com apoio logístico e narrativo do trumpismo, ampliaram a produção de desinformação. O Brasil tornava-se laboratório e vitrine dessa ofensiva híbrida.

Em 2020, com a derrota de Trump para Joe Biden, o manual de sabotagem eleitoral foi exportado. A narrativa de “fraude eleitoral” — que inflamou os EUA — foi adaptada ao Brasil, visando desacreditar o sistema eleitoral antes mesmo de 2022. No ano seguinte, o ataque ao Capitólio, em 6 de janeiro, funcionou como ensaio geral do que viria aqui. Empresários, políticos e influenciadores começaram a preparar o terreno para uma ruptura institucional, enquanto as Big Tech hesitavam em conter conteúdos extremistas que garantiam cliques, monetização e alcance global.

O calendário avançou para 2022, e a engrenagem girou a pleno vapor. Fake news massivas atacavam as urnas eletrônicas, o TSE e o STF. Eduardo Bolsonaro, em sintonia com o trumpismo, repetia teorias conspiratórias importadas. Influenciadores mobilizavam militantes para acampamentos e atos que pediam abertamente intervenção militar. O terreno estava pronto para o golpe.

O dia 8 de janeiro de 2023 escancarou o objetivo: invasão e depredação das sedes dos Três Poderes em Brasília, uma cópia quase literal do que se viu no Capitólio. Investigações revelaram o financiamento empresarial, a articulação política e a mobilização digital que sustentaram a tentativa de golpe. Logo depois, veio a segunda fase: transformar os criminosos em “presos políticos”, minimizar a gravidade dos ataques e reescrever a história em tempo real.

Mesmo após o fracasso, a quinta-coluna não recuou. Em 2024, adotou um novo figurino, falando em “perseguição política” e “defesa da liberdade de expressão” para manter a base mobilizada e atrair apoio internacional. Enquanto isso, Trump voltou a usar tarifas e ameaças como instrumentos de humilhação contra o Brasil, e seus aliados internos aproveitaram para explorar politicamente cada tensão externa, minando a confiança no governo e preparando terreno para o retorno do bolsonarismo ao poder. As Big Tech, alegando neutralidade, mantiveram o palco aberto para essa encenação.

Não há como suavizar: essa rede não é oposição legítima. É braço interno de uma ofensiva autoritária internacional. Vestem-se de verde e amarelo, mas carregam no peito a bandeira estrangeira. Falam de liberdade, mas agem para destruí-la. Usam a palavra democracia como biombo para o assalto contra ela.

A dignidade de um povo não se negocia. E a liberdade não sobrevive quando é entregue a quem sonha em destrui-la. Resistir à humilhação externa exige enfrentar, sem hesitação, a traição interna. Só assim o Brasil poderá preservar sua soberania, proteger sua democracia e impedir que um roteiro importado e já testado para o caos seja novamente encenado no nosso território.

 

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