PENSAMENTO PLURAL Pix e Drex: da inovação brasileira ao desafio global, por Palmarí de Lucena

Em seu comentário, o escritor Palmarí de Lucena afirma que o Brasil surpreende o mundo com o Pix e o Drex. “O primeiro democratizou pagamentos instantâneos; o segundo, apoiado em blockchain, promete revolucionar a moeda”, acrescenta. Ambos reduzem custos, ampliam inclusão e oferecem autonomia frente a choques externos, como decisões unilaterais dos EUA. Mais que inovação tecnológica, representam soberania financeira e ensaio de futuro para países emergentes. Confira íntegra...

O Brasil, tantas vezes associado a atrasos institucionais, surpreendeu o mundo ao se tornar pioneiro em duas frentes de inovação financeira: o Pix, sistema de pagamentos instantâneos, e o Drex, moeda digital em desenvolvimento pelo Banco Central. Ambos já impactam a economia doméstica e começam a reposicionar o país no debate sobre o futuro do sistema financeiro mundial. Criado em 2020, o Pix revolucionou a forma de pagar e receber no Brasil. Tornou-se ferramenta de inclusão para milhões de pessoas antes marginalizadas do sistema bancário, eliminando barreiras e reduzindo custos. Pagamentos instantâneos, gratuitos e disponíveis 24 horas mudaram hábitos e obrigaram bancos e operadoras de cartão a rever tarifas, num reequilíbrio silencioso de poder econômico. No exterior, o Pix passou a ser observado como modelo de política pública eficaz. Diferente de soluções privadas como PayPal ou Venmo, o sistema brasileiro é universal e regulado pelo Banco Central, o que garante credibilidade e capilaridade. Países da América Latina, da Ásia e até da Europa já estudam replicar o modelo.

Enquanto o Pix redesenhou os meios de pagamento, o Drex pretende transformar a moeda em si. Trata-se da versão digital do real, baseada na tecnologia blockchain, um registro digital descentralizado e criptografado que funciona como um livro-caixa público, onde as informações são gravadas em blocos encadeados e praticamente impossíveis de serem alterados. Essa estrutura dá ao Drex a possibilidade de ampliar a segurança das transações, estimular a tokenização de ativos e viabilizar contratos inteligentes no crédito, no mercado imobiliário e no agronegócio. Ao lado do yuan digital da China e dos testes do Banco Central Europeu, o Drex coloca o Brasil na vanguarda de um movimento global por moedas digitais soberanas. A diferença é que o país arrisca-se a criar um ecossistema onde moeda digital, identidade digital e mercado tokenizado se entrelacem de forma prática e acessível.

Os avanços, no entanto, não estão isentos de riscos. O Pix, ao acelerar transações, abriu espaço para golpes digitais e fraudes instantâneas. O Drex desperta dúvidas sobre privacidade, concentração de dados e exclusão tecnológica em um país ainda marcado pela desigualdade digital. No cenário internacional, há também tensões: sistemas como Pix e Drex podem reduzir a dependência de intermediários globais, relativizando o peso do dólar como moeda dominante. Isso interessa sobretudo a países emergentes, frequentemente vulneráveis a choques externos, como mudanças súbitas nas políticas monetárias do Federal Reserve ou em barreiras comerciais e tributárias impostas pelos Estados Unidos. Ao criar instrumentos próprios, mais autônomos e resistentes, o Brasil ensaia um caminho de imunização parcial contra as ondas de instabilidade que emanam de Washington.

Assim, o Brasil se tornou um laboratório de inovação financeira com repercussões muito além de suas fronteiras. O Pix provou que é possível democratizar o acesso a pagamentos instantâneos e gratuitos. O Drex, se bem implementado, pode inaugurar uma moeda digital inclusiva, segura e integrada ao cotidiano. No plano interno, os ganhos já se mostram em menores custos, maior formalização da economia e estímulo à competição. No plano global, Pix e Drex abrem a possibilidade de blindar economias emergentes contra as turbulências externas, reduzindo a vulnerabilidade a decisões unilaterais de grandes potências. O mundo observa, com curiosidade e cautela, como um país em desenvolvimento ousa propor — e testar — os contornos do futuro do dinheiro.

 

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