PENSAMENTO PLURAL O preço da hostilidade: turismo em queda nos EUA, por Palmarí de Lucena

O turismo nos Estados Unidos, outrora símbolo de hospitalidade, sofre retração com tarifas punitivas, discursos hostis e incertezas sobre vistos, segundo dados obtidos pelo escritor Palmarí de Lucena. As chegadas internacionais caíram, hotéis e cassinos acumulam quartos vazios, e a imagem de país acolhedor se desfaz. Para brasileiros, a queda de 21% nas visitas em 2025 reflete mais que o câmbio: é o medo de rejeição nas fronteiras. “Ao substituir pontes por barreiras, os EUA corroem sua própria influência”, lembra. Confira íntegra…

O turismo sempre foi um dos ativos mais poderosos dos Estados Unidos. Mais que uma fonte de divisas, é uma vitrine cultural que movimenta cidades, gera empregos e projeta a imagem de uma nação aberta. Hoje, porém, esse patrimônio simbólico e econômico se desfaz diante de uma tempestade anunciada: tarifas punitivas, políticas hostis a estrangeiros e a incerteza crescente sobre vistos. O que antes era sinônimo de hospitalidade e fascínio global se converte em cenário de retração.

Os números falam por si. Em março de 2025, as chegadas internacionais caíram mais de 11% em comparação ao ano anterior. O Canadá, vizinho historicamente fiel, reduziu drasticamente suas viagens em boicote silencioso às tarifas. Alemanha, Espanha e Reino Unido também enviaram menos turistas. Nova York projeta a perda de dois milhões de visitantes, um rombo de quatro bilhões de dólares; Las Vegas, cartão-postal do entretenimento, registra centenas de milhares de quartos vazios.

Não é apenas o bolso que sofre: a retórica política pesa tanto quanto os custos. Quando o estrangeiro é tratado como ameaça, famílias passam a escolher Paris em vez de Orlando; estudantes optam por Berlim em lugar de Boston; empresários descobrem Singapura em vez de São Francisco. A percepção de ser menos bem-vindo corrói a confiança, e o impacto é imediato.

A economia do turismo é sensível a qualquer abalo. Estudos mostram que aumentos de apenas 9% a 10% no custo final já reduzem em até 8% o fluxo de visitantes. Se a isso se somam tarifas elevadas, discursos de desconfiança e dúvidas sobre a concessão de vistos, cria-se uma barreira quase intransponível. O efeito pode alcançar até 29 bilhões de dólares em perdas em 2025.

O Brasil, nesse cenário, oferece um contraste revelador. Em 2024, mais de 1,35 milhão de brasileiros visitaram os Estados Unidos, um crescimento de 20% sobre o ano anterior, com Miami consolidada como destino favorito. Mas 2025 mudou a curva: só nos primeiros meses, as visitas caíram 21%. O câmbio desfavorável pesa, mas pesa ainda mais o ambiente hostil — tarifas de até 50% sobre produtos brasileiros, discursos nacionalistas que tratam o estrangeiro como suspeito e uma atmosfera de incerteza permanente. 

Não se trata apenas da dificuldade de obter o visto, mas da possibilidade real de ser rejeitado na entrada, submetido a constrangimentos nos aeroportos ou até mesmo ter a permanência cancelada durante a estadia. O resultado é corrosivo: o turista brasileiro, que antes viajava para consumir, estudar, fazer negócios ou simplesmente se divertir, passa a sentir que não é bem-vindo, que cruza fronteiras não como visitante, mas como intruso.

As consequências vão além da contabilidade. Cada visitante estrangeiro é, em essência, um embaixador informal: volta ao seu país levando experiências, vínculos culturais e empatia. Ao afastar brasileiros, canadenses, europeus e asiáticos, os Estados Unidos perdem não apenas bilhões em receitas, mas também um capital simbólico que sempre alimentou sua projeção global.

A pergunta, portanto, é inevitável: que país desejam ser? Um destino fechado em muros alfandegários, discursos nacionalistas e vistos incertos, ou uma nação que encara a hospitalidade como ponte entre povos e motor de prosperidade? O futuro do turismo americano — e a permanência do Brasil como parceiro preferencial — dependerá da resposta a essa escolha.

 

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