PENSAMENTO PLURAL O STF e a falsa acusação de tribunal de exceção, por Palmarí de Lucena

“Chamar o STF de tribunal de exceção é deturpar a Constituição de 1988, que veda tal figura”, alerta o escritor Palmarí de Lucena, em seu comentário. Para o autor, “diferente dos tribunais da ditadura, marcados por silêncio e arbitrariedade, a Corte assegura contraditório, ampla defesa e decisões públicas”. Paradoxalmente, acusados de colarinho branco contam com os melhores juristas, enquanto milhões enfrentam a justiça sem amparo. “O verdadeiro risco à democracia não está no Supremo, mas no oportunismo que manipula a memória da exceção”, acrescenta. Confira íntegra...

Volta e meia surgem acusações de que o Supremo Tribunal Federal teria se convertido em um tribunal de exceção. O termo, carregado de gravidade, não deve ser usado de forma leviana. A Constituição de 1988 proíbe explicitamente a criação de tribunais dessa natureza. O STF, ao contrário, é parte permanente do Estado, com ministros indicados por regras constitucionais, sabatinados pelo Senado e julgando em sessões públicas, abertas ao escrutínio de todos.

Um tribunal de exceção nasce após os fatos, para punir adversários específicos, sem garantias de defesa, sem contraditório, sem imparcialidade. Foi assim durante a ditadura militar, quando os Tribunais de Segurança Nacional condenaram sumariamente estudantes, sindicalistas e jornalistas em processos de fachada. Ali estava a exceção: a toga servindo de biombo para a violência política.

O Supremo de hoje opera de maneira oposta. Divergências entre ministros não são sinal de perseguição, mas de pluralidade. Há direito de defesa, prazos, votos fundamentados e transparência. Criticar decisões faz parte da vida democrática; transformar a Corte em bode expiatório é deslegitimar a própria democracia.

É importante salientar, ainda, que mesmo acusados de crimes contra o Estado democrático de direito ou de colarinho branco não estão privados de garantias. Ao contrário: contam com o direito à ampla defesa, ao contraditório e, muitas vezes, com a assessoria dos mais competentes juristas do país. O paradoxo é que, enquanto desfrutam desses recursos, clamam por igualdade de direitos como se fossem vítimas de uma estrutura injusta, esquecendo que milhões de brasileiros enfrentam o sistema sem apoio jurídico adequado.

E é preciso frisar o oportunismo político de certos atores — amadores, democratas analfabetos ou aspirantes a uma nesga de sol — que usam a retórica da exceção como manto para barganhar prestígio em fundos partidários e emendas parlamentares. Essa busca por protagonismo não fortalece a política, mas corrói a confiança da sociedade nas instituições.

A história já mostrou o que é viver sob tribunais de exceção: silêncio, medo e arbitrariedade. O STF, com suas imperfeições, é justamente o antídoto contra a volta desse passado. Defender a Corte não é blindá-la de críticas, mas reconhecer que sua existência é parte do pacto democrático. O que ameaça a democracia não é a divergência dentro do Supremo, mas o uso cínico da exceção como arma política para enfraquecer a Constituição.

 

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