
Em seu comentário, o cineasta Durval Leal utiliza-se de uma expressão antiga, para ancorar explicitar como “a traição política não é mero acaso, é a engrenagem vital do jogo partidário, onde cada lance parece mais um “tomem e salve-se quem puder”. Confira íntegra…
Essa é uma expressão antiga que já deveria ter sido aposentada pelo bom senso, mas segue firme como símbolo de algo errado ali, no meio do ambiente, a incomodar, a não se encaixar.
Porém, será que é o bode que está na sala ou é a traição que move essa encenação toda?
Vamos combinar, o bode, com seus chifres e cheiro forte, é só o mensageiro daquilo que ninguém tem coragem de enfrentar. Traição, essa sim, sempre esteve presente, da Bíblia até as ruas, dos salões do poder até os ateliês de arte. Desde os tempos de Caim e Abel, narrados no Gênesis, pelos 30 dinheiros de Judas, no Cristianismo, a Marcus Brutus e César, claro, no Senado, e assim desde priscas eras que a humanidade já convive com o hábito performático de trair. Caim matou Abel, o primeiro homicídio da história e, certamente, a primeira vitória da traição.
E não parou por aí. Em cada esquina da história, em cada capítulo político ou cultural, ela teima em se fazer presente, às vezes com mais glamour, outras vezes em plena decadência moral. Essa velha colega das desavenças e do desamor tem várias máscaras, mas todas se exibem no mesmo rosto, EGO.
Política, claro, é palco privilegiado da traição. Quantas vezes vimos governantes venderem suas promessas aos anônimos para depois jogá-los num teatrinho vazio de vocação e honestidade, mas com num descaradamente de serem corruptos, a traição a população e ao bem publico? A traição política não é mero acaso, é a engrenagem vital do jogo partidário, onde cada lance parece mais um “tomem e salve-se quem puder”. Assim, partidos viram mercados de interesses, trair vira moeda corrente, e o povo assiste perplexo ao baile dos mascarados. Honesto!?
Ah, a honestidade nesse baile é comédia das mais finas. Mas a traição não se contenta em se esconder somente por aí, mascarada também se acultura. No reino da arte, a traição é ainda mais sutil e, por que não, mais cruel. O ego artístico é um campo minado para o traidor disfarçado. O criador que vê seu território invadido pelo plágio, pela apropriação indevida, pelo roubo da ideia que germinava em silêncio, sabe bem do que falo. És uma vil criatura.
Essa traição é das mais vorazes porque além de roubar a obra, quer roubar também a identidade, a autoria, a própria alma criativa. É o faro de raposa diante do ovo alheio. A ironia é que a arte, essa forma sublime de expressão, vê sua pureza manchada pela mesma podridão de onde se tem Vilão.
O traidor, revestido em várias camadas de disfarce, se diz criador, reinventor, mestre de boas intenções. Mas não passa de um mascarado que, enquanto pinta sua própria imagem, não consegue esconder o torpe ato de subtração que realizou. A máscara do traidor nunca é forte o bastante para ocultar o que há de podre por trás da criação.
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