
Em seu comentário, o cineasta Durval Leal lamenta como “vivemos um tempo em que a política se tornou um vinil riscado, o disco gira, mas toca sempre a mesma música”, e relembra o escândalo do Mensalão, e afirma como “hoje o Lado A é a direita, e o Lado B é a esquerda. E, ironicamente, os dois tocam a mesma canção desafinada. Ambos convivem nas sombras das safadezas, das ingratidões, das maldades e das sacanagens.” Confira íntegra…
Incrível mesmo é a avestruz. Diante dos fatos, enfia a cabeça no buraco e expõe o traseiro ao chute alheio. É assim que vejo o Lado A e o Lado B da política, um espetáculo de cegueira e vulnerabilidade coletiva. Vivemos um tempo em que a política se tornou um vinil riscado, o disco gira, mas toca sempre a mesma música.
Se você tem memória e relembra os desmandos de corrupção de 2003 a 2014 do Lado A você é fascista e de direita, se você fala dos aloprados sem rumos, você está em cima do muro, se você chama o Lado B de golpistas, idiotas que ficaram acampados e invadiram a praça do Três Poderes, que grita mito para um facínora que no primeiro ato foi defender os filhos de rachadinhas, você é de esquerda, um irmão Petralha.
Como uma avestruz coloquei minha cabeça no buraco e tentei ver esse cenário.
Autoridades togadas e responsáveis por institutos jurídicos reagindo vendo suas famílias em comunidades como Rocinha, Morro do Alemão ou Penha. Diante de situações em que filhas fossem molestadas ou filhos coagidos, questiono se manteriam a defesa rigorosa do devido processo legal, garantindo direitos a traficantes, estupradores, milicianos e menores envolvidos em latrocínio, dando direito aos DESUMANOS. Não consigo imaginar esses mesmos agentes públicos enfrentando cobranças de gatonet, sobrepreço de gás ou expulsões de moradia.
Imagine, se legislativo, judiciário e executivo experimentassem por um instante a condição de povo, outras decisões seriam tomadas. Os lados A e B em disputa talvez evitassem riscos e confrontos disputando quem é dono da SEGURANÇA ALHEIA. Considero que, ao serem tratados como figuras elevadas, não dependem de proteção divina, pois tiveram acesso à educação e saúde custeadas pelo erário. Eles fazem perdão, entre pares de Brasília, parece negocio bingos, “DE ROMBO”, sobretudo quando envolve seus intermediários laranjas de CNPJ.
Gostaria de ver um deputado ou juiz caminhando sem carro blindado pelas ruas do Rio de Janeiro, onde para a população comum restam balas perdidas, cobranças de milícias e convivência com marginais e milícia. Como uma avestruz cega busco um togado que defenda férias de 30 dias como do povo comum. E que o devido processo legal é não receber mais do que o teto salarial constitucional. Faço uma análise critica de um cenário em que benefícios como férias extensas e penduricalhos permanecem intocados. Ainda por conta posso ser enquadrado por falar o que penso.
A avestruz continuou usuária dos mesmos discos “malhados”, digo arranhados.
Antes, quando existiam discos de verdade, o antigo bolachão de vinil, o lado A e o lado B eram complementares. Um não era melhor do que o outro. O artista cuidava dos dois, com zelo e propósito, para que o público tivesse prazer em ouvir o álbum inteiro. Havia harmonia, ainda que cada faixa tivesse sua própria voz. Mas, na política, o nosso disco rachou, o lado A desafina, é corrupto e compactua, o lado B arranha, é corruptor e golpista, e ambos se revezam no mesmo toca-discos da hipocrisia nacional.
Com a Guerra Fria, o mundo virou uma disputa de lados. De um lado, o comunismo, União Soviética e China erguendo bandeiras vermelhas em nome da igualdade, e supremacia para seus lideres. Do outro, o capitalismo, Europa e Estados Unidos prometendo liberdade, desde que o lucro viesse primeiro, e pratos vazios somassem lucros. No fundo, eram dois lados de uma mesma moeda enferrujada, um usurpava, o outro reprimia, um vendia sonhos, o outro rasgava utopias. O cidadão comum era apenas o vinil riscado, rodando sem fim na vitrola dos poderosos.
Chegamos então à farsa suprema dos tempos modernos. Agora temos o golpe que não foi golpe, porque o chefe dos golpistas desistiu do golpe, e foi assistir à baderna de longe, talvez com pipoca e refrigerante. SEM PERDÃO. Temos a justiça que prende, solta, absolve, e se orgulha disso, pois justiça de fato não prende mocinhos. Temos ladrões corruptos, uns confessos, e outros que não se convencem que são ladrões, usavam capa e espada para um Brasil melhor, outros são ladrões de verdade pois devolveram milhões e, por isso mesmo, foram perdoados, por membros de “institutos”. MAS OS CHEFES NÃO FOI ABSOLVIDOS!
Vivemos a era dos “irmãos”, que não precisaram pagar nada, confessaram tudo e hoje desfilam livres, leves e soltos. A Petrobras nunca foi saqueada, não houve crime na venda das joias da Arábia, o Mensalão foi uma miragem, o escândalo dos Fundos de Previdência dos Funcionários dos Correios um mal-entendido, e o tráfico virou negócio de “usuários culpados e traficantes injustiçados”. A corrupção? Essa virou personagem coadjuvante, usada por todos os roteiristas e repentistas das cortes da República.
Hoje o Lado A é a direita, e o Lado B é a esquerda. E, ironicamente, os dois tocam a mesma canção desafinada. Ambos convivem nas sombras das safadezas, das ingratidões, das maldades e das sacanagens. O Lado A grita “moral e bons costumes”, enquanto assina contratos suspeitos. O Lado B clama “justiça social entre os pares”, enquanto distribui cargos e verbas para proteger companheiros fiéis.
E o povo? Esse continua girando na vitrola, achando que um lado ainda pode tocar melhor que o outro.
Hoje o cenário político é uma coleção de discos arranhados. De um lado, Fulaninho é “mito”; do outro, Beltraninho é “pai dos pobres”. Ambos desafinam no mesmo tom de cinismo. E nós, os ouvintes, estamos perdidos entre o ruído e o silêncio. Perdemos a capacidade de discernir, de criticar, de lembrar. Tornamo-nos consumidores de propaganda, e não cidadãos de verdade. Mas, se você tiver memória e autocrítica é banido, “não és meu amigo com esse pensamento”, “eita nem quero ler essas inverdades”.
Enquanto isso, jornalistas venais se especializam em vender opiniões. A manchete de hoje embrulha o peixe de amanhã, obviamente meu caro Nélson. E os jornais, outrora templos da informação, viraram palcos de torcida organizada, hoje temos os PODCAST, dos alienados. Cada veículo tem seu lado: o A ou o B. Nenhum quer ser o lado da verdade.
O mais trágico, ou talvez o mais cômico, é ver as bolhas sociais inflando de indignação seletiva. Cada grupo vive dentro de sua redoma, alimentando ódio, idolatria e desinformação. O cidadão médio virou ouvinte passivo de redes sociais, repete frases prontas, compartilha fake news, defende seu ídolo e xinga o adversário. Tudo em nome da pátria, da família e, claro, do engajamento. Mas há os que vivem fora da bolha, os que ainda possuem autocrítica, memória e vergonha. Esses sabem que o jornal de hoje serve para embrulhar o peixe amanhã, e que o político de hoje será o escândalo de amanhã. Sabem que tanto o Lado A quanto o Lado B são cúmplices da mesma tragédia, a desmoralização do país pela corrupção dos pares partidos.
O problema é que, enquanto uns pensam, outros berram. Enquanto uns refletem, outros se ajoelham diante de falsos profetas, cada um com sua Bíblia ou sua carteira de partido na mão. O fanatismo virou fé, e a consciência virou mercadoria.
No fim das contas, o Lado A e o Lado B da política brasileira não passam de dois buracos na mesma areia, um esconde a cabeça, o outro mostra o traseiro. A avestruz nacional continua ali, firme, esperando o próximo chute. Ou uma dose de Cloroquina.
E nós, eleitores, assistimos ao espetáculo como quem observa o disco girar. Sabemos que a música é ruim, mas continuamos apertando “play”. Porque, no fundo, somos todos cúmplices do mesmo som desafinado, aquele que ecoa há décadas, misturando promessas, golpes e impunidades, enquanto o Brasil dança, cego e contente, no vinil rachado da própria história.
Diga não, as férias de 60 dias e salários fora do piso constitucional, aqui começa o desrespeito. FORA PRIVILÉGIOS. ELES SÃO OS DJS!!!
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