CASO GEO Considerações de advogado sobre circunstâncias e futuro de envolvidos
Esse de fato é um assunto extremamente complexo, e o Blog tem evitado abordar, até em respeito às famílias envolvidas, de uma parte e de outra. Mas, recebemos um longo email do advogado Kennedy Aguiar, postulando a necessidade de reflexão e de se evitar a tentação do prejulgamento, para condenar ou absolver, no caso que aflige a tantos, e talvez com graves consequências para o futuro dessas crianças e adolescentes.
O Blog tem mantido a postura de, nesses casos tão polêmicos, abrir espaços para a opinião de todos, de um lado e de outro. Assim, quem eventualmente se sentir melindrado com o comentário do advogado Kennedy Aguiar, saiba que estaremos abertos para também publicar sua versão, e deixar que o leitor faça o seu julgamento. E, por último, pontuar que opinião do advogado e de outras aqui publicadas não representam necessariamente a posição do Blog.
CONFIRA A ÍNTEGRA DO ARTIGO DE KENNEDY AGUIAR…
Após questionamentos de amigos e conhecidos acerca de fato que tomou conta do noticiário paraibano, “Adolescentes e zelador abusam de crianças dentro da escola em João Pessoa”.
Resolvi externar publicamente minha opinião, com base nos fatos noticiados na imprensa.
Primeiro, na condição de pai, e advogado, fico extremamente preocupado com os acontecimentos trazidos à baila. Nós, pais precisamos ficar mais vigilantes com o dia-a-dia de nossos filhos.
A situação exposta é gravíssima, e do ponto de vista psicológico poderá trazer sequelas para a vida inteira dos envolvidos, notadamente as crianças “supostamente” abusadas.
E veja, quando falo “Supostamente”, é pelo fato de quê, vivemos sob a égide de um Estado Democrático de Direito, aonde deve-se sempre prevalecer o contraditório, o “Devido Processo Legal”, dispositivo contido na nossa Carta Magna, ou seja, a Constituição Federal de 1988.
Não sei se é do conhecimento de muitos ou da lembrança de alguns, mas em abril de 1994, teve uma denúncia em São Paulo contra proprietários da “Escola de Base” e um motorista de van escolar, onde, ambos foram acusados de abuso sexual contra alunos daquela escola.
Resultado, a população local, fez inúmeros protestos por meio da imprensa, leia-se : jornais escritos, tele-jornais e revistas de circulação nacional, tendo em vistas que há 25 anos a mídia eletrônica e redes sociais ainda eram embrionárias, ou simplesmente não existiam, mas enfim, após a repercussão do caso, o delegado titular do inquérito decretou a prisão dos envolvidos, e como consequência populares depredaram toda a escola.
Resumo da história, passada a fase de inquérito policial e instrução processual, ambos os acusados foram ABSOLVIDOS.
Mas aí, AÍ era tarde, pois esses envolvidos tiveram suas vidas dilaceradas e literalmente destruídas, algo que por conseguinte atingiu os familiares desses.
Mas voltando ao caso ocorrido recentemente, vejamos:
* É algo estarrecedor ver esse tipo de situação acontecendo em dias atuais;
* Faz-se necessário todo o rigor nas investigações e na instrução processual para penalizar os eventuais culpados, respeitando o “Devido Processo Legal”, mas com todo o rigor da LEI;
* É importante lembrar aos que não tem o necessário conhecimento, que na legislação pátria vigente, existe diferença de penalidades para menores e maiores, ou seja, caso exista adolescentes envolvidos, estes terão suas penas, do ponto de vista penal/criminal atenuadas pelo fato de serem “menores”, senão vejamos o que dispõe a nossa legislação:
- Menor não pode ser preso, se for o caso, será apreendido;
- Em até 45 dias, o adolescente é julgado em uma vara da Infância e Juventude;
- Comprovada a autoria do ato, o jovem sofre medidas socioeducativas (privação da liberdade, semiliberdade ou liberdade assistida);
- A internação pode durar no máximo três anos e não tem um prazo mínimo predeterminado.
O Estatuto da Crianças e Adolescente – ECA, assim dispõe:
(…)
Art. 103. Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal.
Art. 104. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às medidas previstas nesta Lei.
Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, deve ser considerada a idade do adolescente à data do fato.
Art. 105. Ao ato infracional praticado por criança corresponderão as medidas previstas no art. 101.
Fugindo momentaneamente da letra fria da lei, fazendo parêntese:
Em sã consciência, ninguém e nenhum pai ou mãe, ensinariam ou ensinarão esse tipo de coisas aos filhos, notadamente crianças e adolescentes, respectivamente. Agora, pergunto : “Até que ponto os pais de um ou outro lado tem alguma responsabilidade, além claro da previsão legal ?
Até que ponto, nós, pais de família nos preocupamos e acompanhamos o dia-a-dia de nossos filhos ? Coisas simples, tipo perguntar :
“Meu filho, minha filha, como foi seu dia na escola ?”
Veja, em face do ritmo de vida que levamos, muitas vezes terceirizamos a função de “Pai ou mãe”.
Contratamos a van que leva e traz da escola;
A babá ou cuidadora que faz a refeição, dar o banho ou ensina bons costumes;
O reforço que ensina a atividade passada pelos professores em sala de aula, para que seja feito em casa.
Enfim, na correria do dia-a-dia, terceirizamos quase tudo. Esquecemos simplesmente de perguntar: “Como está você meu filho(a) ?
Muitas vezes no afã de proporcionar a melhor educação, uma melhor formação profissional para o futuro vindouro, terceirizamos nossas obrigações.
E até que ponto isso pode impactar na vida de nossos filhos ?
Mas enfim, é apenas uma reflexão.
Voltando ao cerne da questão. Muitos tem sido os comentários dos populares que apenas o mais pobre, leia-se, o zelador, irá pagar pelos eventuais ilícitos cometidos.
Preciso afirmar, um engano ou equívoco profundo. Todos irão e devem arcar com as consequências de seus atos e/ou negligência. Todavia, cada um dentro de suas respectivas parcelas de culpabilidade, nos termos da lei. Senão vejamos o que dispõe o artigo 13 do Código Penal Brasileiro:
Art. 13 – O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.
Superveniência de causa independente
- 1º – A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou.
Relevância da omissão
- 2º – A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem:
- a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância;
- b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado;
- c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.
Enfim, os fatos noticiados são extremamente graves e sérios, a comunidade envolvida precisa ficar atenta e ser vigilante no transcurso do inquérito policial e instrução processual, agora, não se pode CONDENAR ou ABSOLVER de forma antecipada.
Preciso entender que existe um ordenamento jurídico que baliza nossas vidas em sociedade. Necessário acreditar nas leis e autoridades respectivamente, pois a “Lei de Talião” do latim lex talionis, também dita pena de talião, consiste na rigorosa reciprocidade do crime e da pena — apropriadamente chamada retaliação. Esta lei é frequentemente expressa pela máxima “olho por olho, dente por dente”. É a lei, registrada de forma escrita, mais antiga da história da humanidade.
Lá, nos primórdios da humanidade assim se resolviam as coisas, a ideia da época era que o crime deveria ter um castigo justo.
Mas enfim, a sociedade evoluiu muito desde então, repito, as leis balizam e disciplinam nossas vidas, atividades profissionais e tudo que existe.
Voltando ao caso trazido à lume, os eventuais culpados precisam ser exemplarmente condenados, mas tudo dentro do que estabelece a lei.
Garças a Deus, não me vejo dentro do problema supracitado, todavia, se lá estivesse na condição de pai da criança abusada, conteria minha revolta e a canalizaria todos os esforços para a condenação dos culpados.
Como, se do outro lado estivesse, como pai ou familiar dos acusados/envolvidos, não envidaria esforço no sentido de defender, para que existisse um julgamento com rigor, mais sem abusos ou excessos.
Sem falar ainda que os fatos narrados são passíveis de responsabilidade civil, aonde as vítimas farão jus à indenização pecuniária para minimizar os efeitos dos danos causados.
Enfim, é apenas a opinião de quem é pai, tio e advogado, que está estarrecido com os fatos narrados, mas que antes de tudo, pugna por justiça de verdade, a luz do que estabelece a nossa Legislação.
- Kennedy Aguiar