FESTA DA CULTURA… (vídeo) A FLOR e o Congresso das Academias: cultura, desafios e sustentabilidade, por Palmarí de Lucena

O escritor Palmarí de Lucena repercute, em seu comentário, a realização de dois eventos no último final de semana, que ganharam dimensão nacional: a Flor (Festa Literária do Extremo Oriental) e o Congresso das Academias de Letras do Brasil, mobilizando escritores, editores e leitores de todo País. “O encontro estimulou um debate franco sobre a necessidade de renovação institucional, propondo uma reaproximação entre o saber acadêmico e as expressões populares”, pontua. Confira íntegra…

Entre os dias 23 e 26 de outubro de 2025, João Pessoa testemunhou uma iniciativa rara de integração entre tradição e contemporaneidade: a Festa Literária do Extremo Oriental (FLOR) e o Congresso das Academias de Letras, realizados simultaneamente no Centro Histórico. O evento, promovido pela Confraria Sol das Letras, pela Academia de Cordel do Vale do Paraíba (ACVPB) e pela União Brasileira de Escritores – Seção Paraíba (UBE-PB), alcançou relevância nacional ao unir cultura, literatura e patrimônio em um mesmo território simbólico.

A FLOR foi concebida com um propósito claro — democratizar o acesso à leitura, valorizar autores e agentes locais e reaproximar o público do livro e da palavra. O Centro Histórico tornou-se cenário vivo de atividades literárias, musicais e artísticas. A Academia Paraibana de Letras, o Casarão 34, o Centro Cultural São Francisco e a Praça do Bispo receberam uma programação diversificada que envolveu mesas literárias, apresentações musicais, oficinas de xilogravura, contações de histórias e lançamentos de obras de autores como Mary Del Priore e Matheus Nachtergaele.

A dimensão simbólica da festa foi ampliada pela realização simultânea do Congresso das Academias de Letras, que reuniu representantes de diversas instituições do país para refletir sobre o papel das academias na era digital. O encontro estimulou um debate franco sobre a necessidade de renovação institucional, propondo uma reaproximação entre o saber acadêmico e as expressões populares — especialmente o cordel, que se afirmou como ponte entre o erudito e o popular, entre a tradição oral e a escrita formal.

Entretanto, a análise do evento revela contrastes entre a força cultural e os resultados econômicos. Embora a participação do público tenha superado as expectativas, a sustentabilidade econômica — particularmente na propagação e venda de livros de escritores e cordelistas paraibanos — ficou aquém do esperado. A feira de livros, instalada em um espaço isolado dos núcleos principais de atividades, não obteve a visibilidade e o fluxo de visitantes necessários para impulsionar as vendas e dar retorno aos expositores locais. A distância física entre a feira e os palcos centrais acabou reduzindo o potencial de interação entre o público leitor e os autores, um aspecto essencial para a consolidação de uma economia literária sustentável.

Essa constatação não diminui o êxito simbólico da FLOR, mas aponta para um aprendizado estratégico: eventos culturais de grande porte devem articular planejamento logístico e integração espacial, de modo que o público circule livremente entre as experiências — leitura, música, debate e consumo cultural — em um único ambiente. A sustentabilidade da cultura depende não apenas de estímulo à criação artística, mas também da viabilidade econômica do criador, especialmente de quem vive da palavra impressa e do cordel artesanal.

Ainda assim, a FLOR e o Congresso deixaram um legado inegável. Ao devolver protagonismo às academias de letras e projetar os cordelistas e escritores paraibanos no cenário nacional, os eventos estabeleceram um modelo replicável de ecossistema cultural: aberto, plural e em sintonia com as demandas contemporâneas de inclusão, diversidade e valorização da economia criativa.

Se nas próximas edições o planejamento conseguir integrar mais plenamente os espaços e fortalecer as cadeias de produção e distribuição literária, João Pessoa poderá consolidar-se como capital literária do Atlântico Oriental, onde o livro é visto não apenas como arte ou símbolo, mas como instrumento de desenvolvimento humano e econômico.

O essencial é que a experiência da FLOR não se esgote na lembrança das luzes ou dos aplausos, mas se transforme em política de continuidade. Porque fazer florescer a literatura é mais do que um ato cultural — é um gesto de sustentabilidade social, e um compromisso com a permanência da palavra no coração da cidade.

(* na imagem acima, o mometo Pôr do Sol com Mary Del Priori, Matheus Nachtergaele e Bráulio Tavares)

CONFIRA VÍDEO DE UM TRECHO DO ENCONTRO…