Notas sobre a epístola dos hebreus, confira com o escritor José Mário da Silva
O Blog abre espaço para o artigo “Notas sobre a epístola aos hebreus”, do professor e escritor José Mário da Silva, da Academia Paraibana de Letras, no qual aborda desde a origem da carta considerado um dos documentos mais importantes do cristianismo, e ainda aprofunda reflexões sobre o Antigo Testamento. Um texto primoroso.
Confira sua íntegra…
1-Autoria desconhecida. Ao longo de mais de dois mil anos de fé cristã, ainda não se chegou, de modo definitivo, a um consenso acerca de quem realmente foi o autor da maravilhosa Carta aos Hebreus, não passando, todas as sinalizações nesse sentido, de meras especulações. Paulo, Apolo, Lucas, dentre outros, têm sido apontados como o autor da referida missiva, mas sem nenhuma comprovação abalizada. A despeito disso, o mais importante é sabermos que a Carta aos Hebreus sempre foi recepcionada pela igreja como sendo inspirada, tendo, por isso mesmo, a efetiva chancela dos apóstolos, bem como a sua devida inserção no cânone das Escrituras Sagradas. O autor da Carta aos Hebreus demonstra ser um exímio conhecedor do Antigo Testamento, fazendo uso da Septuaginta, a tradução grega do Antigo Testamento. De igual maneira ele sinaliza conhecer os seus destinatários, deles cuidando de modo eminentemente pastoral (Hb 13:22, 23). Ele, provavelmente, foi levado à fé pelo ministério levado a cabo pelos apóstolos do nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.
2-Data da escritura da carta. Possivelmente, a Carta aos Hebreus foi escrita no período compreendido entre o ano sessenta e o sessenta e quadro d.C, período em que o templo dos judeus ainda estava erguido, neles ocorrendo, com regularidade, o oferecimento de todos os sacrifícios prescritos na antiga aliança. O capítulo dez da carta abona tal aspecto aqui relevado.
3-Destinatário. A Carta aos Hebreus foi endereçada aos judeus convertidos ao cristianismo, e que, por causa disso, estavam sendo alvos de terríveis perseguições por parte dos judeus que não haviam crido que Jesus Cristo era o Messias prometido, o ponto de convergência do cumprimento de todas as profecias que haviam sido escritas a seu respeito no Antigo Testamento. Tais perseguições iam da expulsão de determinadas instituições judaicas, da perda dos bens sem nenhuma espécie de ressarcimento da parte das autoridades, até, em casos extremos, ao assassinato, puro e simples, dos que insistiam em professar a fé em Jesus Cristo, reconhecendo a sua divindade, senhorio e obra redentora. Em face de tais perseguições, muitos crentes judeus estavam desanimando e sendo tentados a abandonar a fé e a retroceder aos padrões de religiosidade do Antigo Testamento, ignorando que tudo já havia recebido pleno cumprimento na pessoa e na obra de Jesus Cristo.
4-Propósito e características da Carta aos Hebreus. Embora a presente carta seja riquíssima em grandes temas teológicos e fecundos ensinamentos doutrinários, há dois que se sobressaem, de maneira sumamente evidente: a) a absoluta superioridade de Jesus Cristo sobre tudo o que apontava para Ele no Antigo Testamento; e que não passava de sombra, da qual Cristo é a definitiva e perfeita realidade; b) a perseverança que os crentes deveriam nutrir em continuar seguindo, incondicionalmente, o Filho de Deus, o único em quem há uma grande e eterna salvação (Hb 2:3). Jesus é o perfeito cumprimento do templo, dos sacrifícios e do sacerdócio, o que demonstrava, claramente, que todo esse sistema veterotestamentário era provisório.
5-A superioridade de Cristo sobre tudo e sobre todos. Para o autor Carta aos Hebreus, Jesus Cristo é superior aos anjos, a Moisés, a Arão, ao ministério sacerdotal do Antigo Testamento, enfim, a todo o sistema sacrificial instituído por Deus no Antigo Testamento, que não passava de sombra da realidade que, na plenitude dos tempos, haveria de vir ao mundo para realizar, de modo definitivo, a gloriosa obra da redenção do seu povo. Tal fato já ocorreu, já é uma realidade plena e suficiente. Cristo, o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo, já veio ao mundo, viveu vida santa, morreu, substitutivamente, pelo seu povo, para ele garantido uma eterna salvação.
6-Um capítulo controverso. Em meio a toda a Carta aos Hebreus, há um capítulo que, ao longo da história da igreja tem sido alvo de grande controvérsia, o capítulo seis, que trata do pecado da apostasia, do abandono da fé por parte daqueles que um dia professaram crer na pessoa e na obra do nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Tal realidade tem feito com que muitos intérpretes da Bíblia Sagrada aventem a hipótese de que um crente genuíno pode vir a perder a salvação, o que nem pode ser depreendido do texto em apreço, nem desfruta do abono da Escritura Sagrada em sua totalidade. O texto em foco aponta noutra direção, qual seja a que nos mostra que é perfeitamente possível alguém dá sinais exteriores de que é salvo, sem que, interiormente, jamais tenha sido realmente salvo. A despeito da dureza da advertência feita pelo autor da carta, por ele mesmo reconhecida, dos genuínos crentes, aos quais ele classifica como amados, o que ele espera “é coisas melhores, coisas relacionadas à salvação”.
7-A importância da Carta aos Hebreus como ponto de transição do Antigo para o Novo Testamento. A Carta aos Hebreus, dentre as várias qualificações de que se reveste, pontifica como um escrito que nos ajuda a compreender o processo de transição do judaísmo para o cristianismo, da fé praticada no Antigo Testamento, com todo o cerimonialismo de que se impregnava, para a fé simples do Novo Testamento, focada, exclusivamente, naquilo que Cristo é, e naquilo que Ele fez na cruz do calvário. A Carta aos Hebreus esclarece, de maneira impressionantemente bela, aspectos extremamente significativos do Antigo Testamento, como o papel da lei, a realização dos sacrifícios, o sistema sacerdotal, dentre outros tópicos igualmente relevantes. Por tudo isso, a Carta aos Hebreus deve ser lida, estudada, amada, compreendida e, sobretudo, praticada em nossas vidas, nas quais o nosso bendito e maravilhoso Salvador Jesus Cristo deve reinar de maneira absoluta. De acordo com que o pontua Stuart Olyott em seu excelente livro A CARTA Aos HEBREUS bem explicadinha e como seu ensinamento se desenvolve na prática, Jesus Cristo é o Herdeiro de Deus, a Expressão Exata do seu Ser, o Criador e Sustentador de todas as coisas, o Redentor, o Dominador e Aquele que se encontra na posição mais elevada nos céus. Assim sendo, abandonar o Cristo da glória e retornar para as sombras presentes no Antigo Testamento significaria trocar o permanente pelo passageiro; o definitivo pelo provisório, o que, na prática, seria mais que uma demonstração de imaturidade espiritual, um grave pecado contra Deus. Que Deus nos guarde de incorrermos em similar pecado. SOLI DEO GLORIA NUNC ET SEMPER.
JOSÉ MÁRIO DA SILVA
PRESBÍTERO