PENSAMENTO PLURAL A professora Ângela e a Academia Paraibana de Letras, por José Mário da Silva
O professor e escritor José Mário é um dos mais profícuos ensaístas da Academia Paraibana de Letras. Em sua crônica desta sexta (dia 15), José Mário destaca o trabalho da professora Ângela Bezerra de Castro, durante o período que esteve à frente da APL. Dentre seus feitos, pontua José Mário, a celebração de um convênio de três anos com a Fundação Joaquim Nabuco, que se iniciou com as comemorações de 80 anos da Academia. José Mário faz justiça ao brilhante trabalho da primeira mulher a presidir a Academia. Confira a íntegra de seu texto…
Conforme já pontuei em escritos anteriores, conheci a Professora Ângela Bezerra de Castro na longínqua quadra cronológica do ano de mil novecentos e oitenta e cinco. Recém-chegado ao curso de Letras da Universidade Regional do Nordeste, hoje Universidade Estadual da Paraíba, eis-me participando do Primeiro Colóquio de Estudos Bandeirianos, importante conclave realizado em Campina Grande, sob os auspícios da competente coordenação da Professora Elizabeth Marinheiro. Mário Hélio, Edson Nery da Fonseca, Maria Goretti Ribeiro, Ângela Bezerra de Castro e Marcus Accioly, eis o qualificado código onomástico de abalizados mestres a percorrer os vãos e desvãos da lírica do imenso Manuel Bandeira, a mais límpida voz de quantas compõem o multifacetado universo da poesia brasileira moderna, de acordo com a categorizada assertiva do erudito José Guilherme Merquior.
Na oportunidade, a Professora Ângela Bezerra de Castro impressionou-me pela serenidade bela do olhar, e pela percuciência crítica de um texto que, sumamente escorreito em sua formulação verbal, se fazia acompanhar, com discreta parcimônia, de sólida fundamentação teórica, haurida numa vida vivida na inseparável companhia dos livros, que se constituem na morada do saber, de conformidade com o luminoso dizer de Afrânio Coutinho em seu instrutivo livro: No hospital das letras. De lá para cá, prossegui na desbordante seara das letras, sempre balizado pelo norte teórico-pedagógico emanado da liderança firme e inspiradora da mestra Elizabeth Marinheiro, mas sem perder de vista a travessia ascensional de Ângela Bezerra de Castro, cuja ensaística categorizada transpôs as demarcações geográficas mais estreitas da Paraíba, ganhando a consagração nacional com o atilado e renovador estudo crítico consagrado à Bagaceira, clássico livro de autoria de José Américo de Almeida, romance que foi recepcionado, entusiasmadamente, por Alceu Amoroso Lima; e que se tornou, indiscutivelmente, um marco no moderno romance brasileiro, exercendo grande impacto e singular influência nos escritores que compuseram o território do chamado romance de trinta, em sua feição, digamos, mais ligada à espacialidade rural, a exemplo de Jorge Amado, Rachel de Queiroz, José Lins do Rego, Graciliano Ramos, dentre outros. Com o livro: Re-leitura de A bagaceira : uma aprendizagem do desaprender, título sobremaneira impregnado de forte sotaque barthesiano, a Professora Ângela Bezerra de Castro, de modo original, amplificou os horizontes já bastante alentados da fortuna crítica da ficção do autor de A Paraíba e Seus Problemas.
Entre as páginas do seu cultivado ensaio literário e a cátedra da sala de aula, tanto no âmbito do ensino médio quanto no do ensino universitário, a Professora Ângela Bezerra de Castro foi consolidando o seu itinerário intelectual vitorioso; o que, ao fim e ao cabo, com o incontestável respaldo do seu eficaz ser-fazer profissional a conduziu, há vinte e dois anos, à Casa de Coriolano de Medeiros, à Academia Paraibana de Letras, em eleição consagradora. Tendo sido vice-presidente da Casa das Letras Paraibana em duas gestões distintas, a Professora Ângela Bezerra de Castro cumpriu a sua missão, para além da oficialidade do cargo exercido; antes, com o inarredável compromisso com a cultura, com as letras, com a arte, com a literatura, enfim, da qual é conhecedora profunda e amante incondicional. Todo esse percurso findou alçando-a, no ano passado, com expressivo apoio dos membros da Academia Paraibana de Letras, ao cargo de presidente da Casa de Coriolano de Medeiros; realidade essa revestida de incomum simbologia, dado que em oitenta anos de existência da Academia Paraibana de Letras, a Professora Ângela Bezerra de Castro é a primeira mulher a ocupar a presidência da instituição sonhada por Coriolano de Medeiros, ao lado de outros personagens igualmente dotados de chamejante visionarismo.
Perto de concluir o primeiro ano do seu mandato, a Professora Ângela Bezerra de Castro sinalizou com uma licença, seguida de um afastamento definitivo das suas funções. Cuidar mais de si mesma, da sua saúde, da sua vida particular, enfim, eis as razões aduzidas pela mestra paraibana para encerrar a sua atividade administrativa no comando da Academia Paraibana de Letras. Razões essas que, ponderadas criteriosamente, devem merecer a nossa compreensão, bem como o nosso completo respeito. Reputo grandemente exitosa a gestão da Professora Ângela Bezerra de Castro na condução da Academia Paraibana de Letras, senão vejamos: trouxe de volta a Revista da Academia Paraibana de Letras, espaço fundamental para que, nele, os confrades e confreiras do eminente sodalício ponham as impressões digitais do seu pensar-sentir-agir no mundo, na esfera das produções do espírito, em estreita consonância com o emblema da Casa de Coriolano de Medeiros: Decus et Opus, o que justifica e legitima a presença na Academia Paraibana de Letras de quantos foram agraciados por Deus com o privilégio de ingressar em seu interior, e dela fazer parte. E, por fim, mas não menos importante, registre-se o gol de placa da gestão de Ângela Bezerra de Castro, cartografado pelo convênio que ela firmou com a Fundação Joaquim Nabuco, instituição que é portadora de grande prestígio nacional. Desse convênio, os primeiros frutos já emergiram nuclearizados pelas conferências que membros da Academia Paraibana de Letras proferiram por ocasião das solenidades comemorativas dos oitenta anos da notável Casa da Cultura Paraibana, ocorridas no recém-transato mês de setembro do ano em curso.
Além das conferências, mais adiante será publicado um livro reunindo textos de membros da Academia Paraibana de Letras sobre autores diversos de nossa rica paisagem literária e cultural. O presente convênio tem duração de três anos, o que certamente haverá de ser preservado na gestão do confrade Ramalho Leite, que sucederá a Professora Ângela Bezerra de Castro na presidência da Academia Paraibana de Letras. Que a Professora Ângela Bezerra de Castro tenha vida longa e cercada de saúde por todos os lados, são os meus sinceros votos, com anelos de que o seu livro: Um certo modo de ler, volume II, se configure como um dos grandes acontecimentos das cenas e cenários da literatura paraibana no ano de dois mil e vinte e dois, que já desponta no horizonte das nossas existências. E que também o confrade Ramalho Leite seja iluminado para desempenhar a contento o ofício de presidente da nossa querida Academia Paraibana de Letras.