PENSAMENTO PLURAL A visão distorcida da lei Rouanet, por Rui Leitão
Uma das polêmicas que mais povoaram a área cultural do País, após a eleição de Bolsonaro, foi quanto ao funcionamento da Lei Rouanet. Em sua crônica, o escritor e historiador Rui Leitão, afirma que é uma inverdade afirmar que “apenas os artistas famosos conseguem aporte de recursos para financiar suas obras”. E pontua: “Queiram ou não, é o principal mecanismo de fomento cultural no Brasil”. Confira a íntegra de seu comentário.
Não é verdade que apenas os artistas famosos conseguem aporte de recursos para financiar suas obras. Há projetos financiados, desde os grandes shows aos que são desenvolvidos em comunidades ribeirinhas. Esse pessoal que teima em condenar a Lei Rouanet, nunca teve a preocupação em analisa-la como funciona. Qualquer brasileiro interessado em conseguir apoio cultural, via Lei Rouanet, pode inserir o projeto no Sistema de Apoio às Leis de Incentivo à Cultura (Salic), de forma eletrônica. Após a inscrição, o governo, através da Secretaria de Cultura (antes era o MinC), tem um prazo de sessenta dias, para autorizar a captação dos recursos, com obrigatória publicação no Diário Oficial da União. Nada feito às escondidas com a intenção de beneficiar indevidamente quem quer que seja.
O investimento propiciado via renúncia fiscal de empresas e pessoas físicas é, então, destinado para produções culturais. O governo apenas faz as verificações para ter certeza de que há o enquadramento ao que exige a lei. Depois disso, é preciso bater na porta das empresas para mostrar o projeto.
Esse dinheiro não sai diretamente dos cofres públicos, e sim de uma renúncia fiscal. As empresas que decidem patrocinar os projetos, podem utilizar até quatro por cento do valor a ser recolhido como imposto de renda para incentivo à cultura. É claro que existem empresas que preferem apoiar famosos que garantam retorno de visibilidade, mas não é regra, nem pode ser motivo para acusação de uso político, como persistem em propagar. Essa é uma falha da lei que precisa ser sanada.
As críticas ideológicas feitas pelo atual governo, no entanto, não atacaram o seu caráter de marketing cultural que, em alguns casos se verifica na preferência das grandes empresas em prestigiar artistas famosos para consequente ganhos de visibilidade. Mas isso não tem nada a ver como favorecimentos políticos. As mudanças implementadas pelo governo não resolveram essa desigualdade de oportunidade que a lei permite acontecer. Nesse aspecto “tudo continua como dantes no quartel de Abrantes”, como se diz no velho ditado popular.
A Lei Rouanet, queiram ou não, é o principal mecanismo de fomento cultural no Brasil. Criado em 1991, portanto completando trinta anos de sua existência. É uma lei de mecenato. Embora represente um dinheiro que iria para o Estado porquanto retirado do imposto de renda, quem decide seu destino é o pagador desse imposto – o mecenas. É uma parceria público-privada, porém a decisão de sua aplicação é privada.
A guerra cultural que se pratica contra a Lei Rouanet, comete o equívoco de classifica-la como instrumento de apoio aos produtores culturais alinhados com as ideias de esquerda. Uma retórica que não encontra respaldo na realidade. A desinformação sobre os benefícios da Lei Rouanet é responsável por essa sistemática crítica de que se tornou alvo, por interesses político-ideológicos. Cumpre-se com fidelidade a lógica oficial de desapreço às manifestações culturais. Alimenta-se uma visão negativa da Lei, agredindo de forma ultrajante os artistas que não rezem na cartilha da direita reacionária, produzindo informações evidentemente mentirosas.
O crítico irresponsável quando procura desqualificar o que o adversário faz, encontra nisso a oportunidade de desviar a atenção de suas próprias imperfeições, mesmo que apoiado em mentiras. É um perverso hábito notoriamente doentio. Crítica sem conhecimento é ignorância.
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