O escritor Palmarí de Lucena aborda em seu cometário o julgamento do ex-presidente Bolsonaro: “O julgamento, iniciado em setembro de 2025, tornou-se símbolo global de resistência democrática. Acusado de conspiração e tentativa de golpe, enfrenta repercussão na imprensa internacional, latino-americana, europeia e asiática.” E ainda: “Para uns, representa o fortalecimento institucional; para outros, risco de normalizar o autoritarismo. Mais que o destino de um ex-presidente, o processo expõe o Brasil como espelho dos dilemas democráticos contemporâneos.” Confira íntegra…
O julgamento de Jair Bolsonaro, iniciado em setembro de 2025, deixou de ser apenas um processo criminal brasileiro. Acusado de planejar um golpe após a derrota eleitoral de 2022, enfrenta denúncias de conspiração armada, incitação à violência e tentativa de subversão da ordem democrática. O que se decide no Supremo Tribunal Federal vai além de seu destino pessoal: tornou-se um teste para a resiliência institucional do Brasil e um tema de repercussão global.
Na imprensa internacional, o tom é inequívoco. A Reuters sublinha a robustez das acusações, com penas que podem ultrapassar três décadas. O Washington Post vê um marco histórico: nunca um líder político brasileiro respondeu formalmente por tentar destruir instituições democráticas. O Guardian projeta que o julgamento pode representar “o começo do fim” para Bolsonaro e sua base política, enquanto o Observer destaca o ineditismo de generais também estarem no banco dos réus. Já o Daily Beast enfatiza a pressão externa, sobretudo a de Donald Trump, que classificou o processo como “caça às bruxas” e retaliou com tarifas e sanções — medidas vistas pela imprensa como afronta à soberania brasileira.
Na América Latina, o caso repercutiu com igual intensidade. O Clarín (Argentina) destacou a postura implacável do ministro Alexandre de Moraes, transformado em símbolo e alvo. O El Universal (México) enfatizou o caráter inédito do processo, lembrando que o continente ainda convive com lideranças autoritárias. O La República (Peru) ressaltou as medidas restritivas impostas a Bolsonaro, como a tornozeleira eletrônica, alertando para o risco de fuga. Para analistas da Americas Quarterly, o processo é também uma arena eleitoral para 2026: mais que um julgamento, uma plataforma para alimentar a narrativa de perseguição.
A Ásia, embora mais discreta, também deixou sinais. A China, por meio de seu Ministério das Relações Exteriores, já havia condenado os ataques golpistas de 2023 e reafirmado apoio à democracia brasileira. A Índia, pela voz do primeiro-ministro Narendra Modi, manifestou solidariedade ao país diante da violência contra instituições. Ainda que não comentem diretamente o julgamento atual, essas reações demonstram a atenção ao desenrolar de uma crise que pode enfraquecer a ordem institucional em uma das maiores democracias do mundo.
Na Europa, a repercussão ecoa em sintonia com a tradição da União Europeia de se posicionar em defesa do Estado de Direito. Jornais como o Guardian e o Observer interpretaram o julgamento como um teste crucial da maturidade democrática brasileira, com potencial de se tornar referência internacional. Ainda que não haja manifestação oficial da União Europeia até o momento, a imprensa do continente vê no processo um espelho das próprias batalhas contra o avanço de forças populistas em países-membros. Nesse sentido, o Brasil é observado não apenas como parceiro estratégico, mas como exemplo de até que ponto uma democracia pode enfrentar o autoritarismo dentro de suas próprias fronteiras.
O que está em jogo, portanto, ultrapassa o Brasil. Uma condenação reforçaria a ideia de que instituições democráticas são capazes de conter a ofensiva populista e garantir que nem mesmo um ex-presidente está acima da lei. Uma absolvição, ao contrário, poderia normalizar práticas autoritárias, oferecendo combustível a lideranças semelhantes em todo o continente e além dele.
O julgamento de Bolsonaro, acompanhado de Nova York a Buenos Aires, de Londres a Pequim, tornou-se um espelho no qual cada nação projeta seus próprios dilemas democráticos. No fim, não se trata apenas do destino de um político. Trata-se de saber se a democracia brasileira — e, por reflexo, a latino-americana — será capaz de emergir fortalecida diante de sua mais difícil prova.
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