PENSAMENTO PLURAL Brasil: A pátria do Judiciário, não dos engenheiros, por Emir Candeia

Em seu comentário, o professor Emir Candeia lamenta que o Brasil, em vez de priorizar a formação de engenheiros, tem investido mais na em outras áreas como Direito e Administração. “Dados recentes mostram que, entre 2015 e 2024, as áreas de Engenharia, Ciências Exatas e Agrárias — as que sustentam o desenvolvimento de qualquer nação — foram as que mais perderam bolsas de mestrado e doutorado no país”, diz. Confira íntegra…

Enquanto o mundo acelera rumo à inovação tecnológica, o Brasil faz o movimento inverso. Dados recentes mostram que, entre 2015 e 2024, as áreas de Engenharia, Ciências Exatas e Agrárias — as que sustentam o desenvolvimento de qualquer nação — foram as que mais perderam bolsas de mestrado e doutorado no país. Ao mesmo tempo, cursos como Direito e Administração cresceram em ritmo acelerado. O curso de Direito, sozinho, mais que dobrou o número de bolsas. Isso diz muito sobre as escolhas (ou omissões) que estamos fazendo.

Estamos formando mais operadores do sistema e menos criadores de soluções. Em vez de engenheiros, formamos advogados. Em vez de inovadores, formamos administradores da escassez. A pergunta que se impõe é: qual futuro queremos construir para o Brasil?

STEM é estratégia — não gasto
Países como China, Índia, Coreia do Sul e Estados Unidos apostam forte nas áreas STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática) por uma razão simples: são essas áreas que impulsionam a inovação, a indústria, a segurança alimentar, a defesa e a soberania tecnológica. Eles sabem que o mundo do futuro será dominado por quem dominar a ciência — não o juridiquês.

No Brasil, o corte de bolsas nessas áreas não é um acidente. É parte de um processo mais amplo de desmonte da educação técnica e científica, iniciado nos anos 2000 e aprofundado em todos os governos seguintes. A consequência disso é clara: perdemos competitividade, ficamos dependentes de tecnologia estrangeira, e nossos jovens mais talentosos ou desistem da carreira acadêmica ou vão embora do país.

Um país que sustenta a balança no lugar de fabricar a mercadoria
A metáfora é simples: enquanto outras nações treinam engenheiros para fabricar o carro elétrico do futuro, o Brasil forma juristas para julgar quem deve ou não andar nele. Estamos obcecados pelo aparato normativo, mas ignoramos a base produtiva. Com isso, viramos o país da Justiça cara, da burocracia sufocante e da baixa produtividade. O Estado engorda, mas a nação empobrece.

Ciência social identitária vs. ciência produtiva
Outro fenômeno que chama atenção é o crescimento de bolsas em áreas que alimentam mais o debate ideológico do que o desenvolvimento técnico. As Ciências Sociais se tornaram, em parte, instrumento de reprodução de agendas identitárias. Enquanto isso, a ciência dura, aplicada, prática — que projeta satélites, melhora sementes, cria remédios ou desenvolve IA — perde espaço, orçamento e prestígio.

Estamos escolhendo ser dependentes
As escolhas de hoje moldam o país de amanhã. Se continuarmos priorizando o Judiciário e as Ciências Sociais em detrimento da Engenharia, da Computação e da Pesquisa Aplicada, estaremos, na prática, escolhendo ser dependentes. Dependentes de tecnologia estrangeira, de insumos importados, de patentes internacionais.

Importamos fertilizantes, chips, softwares, máquinas e remédios — mesmo tendo terra, mentes brilhantes e universidades públicas. Falta apenas decisão política e visão de futuro.

O Brasil não precisa de mais advogados. Precisa de engenheiros, cientistas e inovadores. Só assim deixaremos de ser o país das teses e passaremos a ser o país das soluções.

 

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