Campina Grande teve, não faz muito tempo, um polo industrial dos mais florescentes do Nordeste. Mas, infelizmente, a cidade passa por um acelerado processo de desindustrialização, mudando a cena de seu parque industrial. Em seu comentário, o professor Emir Candeia aborda exatamente esse fenômeno, e traça um comparativo com o que acontece na China, que, progressivamente, transformou-se num grande polo industrial para o mundo. Confira íntegra…
Enquanto a China se consolida como a “fábrica do mundo”, responsável por 33,3% de toda a manufatura global e com presença crescente até no setor de serviços mundo afora, Campina Grande segue um caminho oposto: o da desindustrialização silenciosa e preocupante.
A China, mesmo com baixa proteção social e pouco consumo interno (apenas 13% do total mundial), entende que sua força está em produzir, exportar, ocupar espaços. As empresas chinesas vendem de tudo – do parafuso ao satélite – e já estão controlando ou participando como acionistas de serviços mundo afora, inclusive em setores estratégicos como energia, tecnologia e infraestrutura.
Campina Grande, por sua vez, virou apenas consumidora. Importamos bolacha de Mari, doce de Patos, café de João Pessoa, macarrão de Recife e até carne de frigoríficos do Piauí. Ovos, pregos, tubos de PVC, roupas… tudo vem de fora. É como uma casa onde ninguém cozinha, ninguém costura, ninguém martela um prego – tudo é comprado pronto. Isso custa caro e empobrece a cidade.
Sinais claros da desindustrialização: a lista de vagas oferecidas pelo SINE em Campina Grande é reveladora. Das 983 vagas, quase nenhuma está ligada à indústria de transformação. Não se procura torneiro, fresador, mecânico de manutenção industrial ou auxiliar de produção. A única vaga que tangencia a indústria é para operador de extrusora de plástico e borracha – uma gota num deserto.
A maioria das vagas está no comércio, serviços, atendimento, saúde, gastronomia e telemarketing (que sozinho oferece mais de 400 vagas). Estamos formando uma cidade de “atendentes”, enquanto a base da produção desaba. Um carro sem motor pode ter o melhor banco, o melhor som, mas não vai sair do lugar.
Já tivemos indústrias, e muitas. Campina Grande já foi um polo industrial forte, com fábricas de café, macarrão, biscoitos, sabão, margarinas, óleos vegetais, pregos… Hoje, restam poucas, mantidas pelo esforço quase heroico de empresários locais. Não há renovação, não há novas plantas. O ciclo se rompeu.
E o que fazem os poderes públicos? Nada. O escritório da CINEP, que deveria fomentar a industrialização, quase fechou as portas. Os distritos industriais, criados para atrair empresas, estão abandonados há mais de 20 anos. Não há um único lote preparado pelo governo estadual para oferecer como incentivo locacional. Nenhuma indústria foi trazida a Campina Grande pelo Estado nos últimos anos.
O poder municipal também se omite completamente. Não há projetos, planos ou sequer um discurso animador. Em resumo: estamos à deriva.
Consequências e o risco da irrelevância: sem produção industrial, a cidade perde dinamismo, renda e independência econômica. Fica refém de políticas públicas frágeis e do consumo externo. Perdemos talentos, mão de obra técnica se muda ou se adapta a funções mais simples, subutilizando seu potencial. A juventude que poderia operar uma CNC está vendendo planos de celular ou fazendo entrega de moto.
É como se a cidade estivesse fechando suas fábricas e abrindo caixas registradoras. E, se não há quem fabrique, há pouco para vender e quase nada para investir.
Conclusão: falta um projeto para Campina Grande. Enquanto a China avança pelo mundo como uma locomotiva produtiva, Campina Grande vê seus trilhos enferrujarem. Sem vontade política, sem incentivos, sem estratégia, estamos nos tornando consumidores dependentes em vez de produtores independentes.
A cidade que já foi referência em tecnologia, indústria e educação precisa urgentemente de um novo ciclo industrial. Não é apenas uma questão econômica – é uma questão de identidade e de futuro.
Se continuar assim, Campina Grande corre o risco de virar apenas um entreposto comercial entre Caruaru, João Pessoa e Recife. Uma cidade que assiste seu próprio talento ir embora, enquanto espera por empregos que não exigem mais do que um sorriso e um crachá.
Os textos publicados nesta seção “Pensamento Plural” são de responsabilidade de seus autores e não refletem, necessariamente, a opinião do Blog.