PENSAMENTO PLURAL Carta apócrifa de José Bonifácio aos que aplaudem o tarifaço de Trump contra, por Palmarí de Lucena

Em mais uma carta apócrifa, concebida pelo escritor Palmarí de Lucena, José Bonifácio repudia a submissão do Brasil a ameaças estrangeiras como o tarifaço de Trump. Denuncia a perda de soberania e o aplauso cúmplice de elites nacionais. Defende o direito da Justiça brasileira de atuar livremente e alerta: apoiar sanções contra o próprio país para proteger um político é capitulação, não patriotismo. Confira íntegra…

Senhores,

Com o espírito inquieto de quem já serviu à Pátria em horas graves, ergo a pena — ainda que postumamente — para alertar os que hoje, com risos e retuites, aplaudem o que não deveriam: a humilhação de sua própria terra.

Chegam-me notícias de que um presidente estrangeiro, em meio a seus delírios eleitorais, ameaça o Brasil com tarifas de 50% sobre produtos do labor nacional — como o café e o suco de laranja — caso nossa Justiça prossiga no julgamento de um cidadão acusado de atentar contra a ordem constitucional. Mais alarmante, contudo, é constatar que há brasileiros que aplaudem tal chantagem, como se nela houvesse traço de coragem ou sabedoria.

Não há.

Uma República que se preze não curva seu Judiciário a interesses externos, nem aceita imposições estrangeiras sobre sua soberania. O que vejo, porém, é parte da elite política e midiática a render-se de bom grado, confundindo idolatria com diplomacia e servilismo com estratégia.

Desde quando se deve pedir licença a Washington para aplicar as leis nacionais? Desde quando ameaças comerciais são motivo de júbilo entre aqueles que, em outras ocasiões, vestem verde-e-amarelo e gritam por independência? Silenciar diante disso — ou pior, celebrar — é corroer o princípio da autodeterminação dos povos.

Não escrevo esta carta em defesa de homens, mas de ideias. Que Bolsonaro seja julgado ou absolvido conforme as provas e os trâmites legais. O essencial, contudo, é que esse processo ocorra livre de pressões externas, como convém a uma nação soberana. Negar esse direito é negar o próprio espírito republicano.

Lembro-vos: o Brasil já enfrentou potências, sobreviveu a ditaduras e superou crises. Errou, sim, mas jamais foi um apêndice de vontade alheia. Os mesmos que hoje celebram as sanções de um estrangeiro, amanhã chorarão o custo pago pelo agricultor, pelo exportador, pelo trabalhador. Não há dignidade em ver nossos representantes repetirem, em uníssono, as palavras de quem nos ameaça. É a isso que chamam de patriotismo?

Não confundam amor à pátria com idolatria a líderes de ocasião. Não há grandeza em aplaudir quem fere nossa liberdade para proteger um político, seja ele quem for. Isso não é política. É capitulação.

E capitular, senhores, jamais foi — nem será — destino digno para o Brasil.

Subscrevo-me indignado,
em defesa da Justiça e da soberania de nossa terra,

José Bonifácio de Andrada e Silva
Patriarca da Independência, por dever eterno à Pátria

 

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