PENSAMENTO PLURAL Crônica de uma Câmara Municipal em silêncio e ruído, por Palmarí de Lucena

Em sua crônica, o escritor Palmarí de Lucena pontua como a Câmara Municipal de João Pessoa oscila entre a ação e a inércia, com poucos vereadores produtivos e muitos silenciosos. “Proliferam honrarias simbólicas, nem sempre merecidas, enquanto os problemas reais da cidade seguem ignorados. A profissionalização da gestão não pode maquiar a omissão política. É hora de cobrar mais do que números: queremos presença, debate e compromisso verdadeiro com o povo”. Confira íntegra...

Na cidade onde o sol nasce primeiro, nem sempre a luz alcança os salões do poder. A Câmara Municipal de João Pessoa, espelho multifacetado das vontades populares, vive hoje entre o ofício e o oficioso, entre a pauta e a pausa, entre o tribuno e o ausente.

No primeiro trimestre de 2025, um levantamento — mais jornalístico que científico — lançou luz sobre o desempenho dos vereadores da capital. Jailma Carvalho, Odon Bezerra e Guga Moov Jampa aparecem no topo da produtividade, com números vistosos: dezenas de matérias, projetos de lei, presença em plenário e até alguma repercussão na imprensa. É louvável. Mas há de se perguntar: quantidade é qualidade? E mais: onde estão os projetos que mudam vidas — não apenas os que adornam estatísticas?

Por outro lado, nomes como Durval Ferreira figuram na parte de baixo da tabela, com notas que envergonhariam até um aluno desatento. A ausência de projetos, discursos ou ações sociais sugere não apenas inatividade, mas indiferença. E no jogo da política, o silêncio também é um tipo de ruído — daqueles que incomodam pela omissão.

Ao mesmo tempo, a Câmara aprovou reajustes salariais, liberou R$ 2 milhões para estrutura dos servidores e promoveu 88 emendas à Lei de Diretrizes Orçamentárias. Trabalhou, sim. Mas será que trabalhou para o povo ou para si?

Em paralelo, a produção de diplomas de cidadania, títulos honoríficos e comendas diversas segue em ritmo de usina. Muitos reconhecimentos são justos e merecidos, mas outros tantos parecem brotar não da admiração pública, e sim da conveniência política. A honraria, que deveria ser gesto solene de gratidão da cidade, tornou-se em muitos casos um recurso banalizado — moeda de troca em relações de poder, marketing pessoal disfarçado de homenagem.

Há sinais promissores: adoção de indicadores de desempenho, tentativas de modernização da gestão, uso de relatórios e KPIs — termos que soam mais ao léxico empresarial que à linguagem do povo. A profissionalização da máquina legislativa é necessária, mas não pode servir de verniz sobre a inércia política.

A verdade é que a Câmara ainda se assemelha a um teatro onde poucos atores sobem ao palco com empenho, enquanto outros se escondem atrás das cortinas, esperando que o tempo — e o salário — passem. Falta debate de ideias, confronto de visões, engajamento real com os dramas da cidade: transporte precário, moradia insuficiente, saúde pressionada, juventude sem rumo.

A democracia se fortalece quando seus representantes prestam contas, não apenas por meio de gráficos e rankings, mas por presença efetiva, por empatia com as dores e esperanças da população. A Câmara precisa ser mais do que um repositório de proposituras — deve ser caixa de ressonância dos anseios do povo pessoense.

Por ora, o que se vê é um retrato misto: uns poucos se destacam com brilho legítimo; muitos outros se refugiam na sombra. E no pano de fundo, seguem circulando certificados e medalhas como se bastassem para encobrir o vácuo de ideias e o déficit de ação.

A nós, cidadãos, resta vigiar, cobrar e lembrar que a política municipal é o primeiro degrau da cidadania. Porque é na rua de casa — e não em Brasília — que mora a verdadeira democracia.

 

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