PENSAMENTO PLURAL Enquanto o povo espera, por Palmarí de Lucena

O escritor Palmarí de Lucena afirma, em seu comentária, que a Paraíba vive entre promessas repetidas e um silêncio que revela omissão. “Enquanto alianças políticas se formam com os olhos voltados para 2026, persistem a pobreza, o analfabetismo e a falta de políticas públicas efetivas”, pondera. O texto questiona a política das aparências e a reeleição automática, defendendo que o voto consciente e a cidadania ativa são os caminhos para transformar o Estado em verdadeira casa do povo — e não em cenário eleitoral. Confira íntegra...

Entre promessas recicladas e silêncios convenientes, a Paraíba encara o desafio de transformar discurso em ação e representação em serviço público.

Há um silêncio que pesa sobre a Paraíba — não o silêncio sereno da contemplação, mas o da omissão. As lideranças políticas, imersas em arranjos e cálculos para 2026, parecem ignorar que a vida real continua além dos palanques. Enquanto alianças se formam e se desfazem, o povo espera — por obras, por justiça, por dignidade. Espera por um gesto que ultrapasse o calendário eleitoral e devolva sentido à palavra “governar”.

Os bastidores fervem: conversas, reaproximações, ensaios de alianças. Mas o roteiro é antigo. O debate gira em torno de quem será vice, quem terá legenda, quem mantém fôlego. Pouco se fala de educação, saneamento, segurança, ou das milhares de famílias que vivem sem acesso a políticas públicas básicas. A Paraíba ainda tem 417 mil analfabetos; e cada número representa uma história interrompida, uma voz silenciada pela negligência.

Enquanto isso, nas ruas, a realidade segue impiedosa. Quatro mulheres são violentadas por dia. O esgoto corre a céu aberto em cidades que se dizem turísticas. O semiárido avança sobre o verde, e a desertificação transforma comunidades inteiras em cenários de abandono. A transposição do São Francisco, símbolo de esperança e promessa de redenção, tornou-se metáfora da própria política: um projeto inacabado, ora lembrado em discursos, ora esquecido nas planilhas.

Por fora, multiplicam-se fachadas. Obras inauguradas às pressas, praças reformadas para fotos, escolas pintadas para parecerem novas. Mas por dentro, a estrutura permanece frágil. É a velha “aldeia Potemkin” — a política das aparências, em que se governa pela estética, não pela substância. O verniz do marketing encobre a ferrugem das desigualdades.

O debate público, quando surge, escorrega para o pessoal. A crítica vira ataque, e o argumento se dissolve em moralismo seletivo. Uns acusam os outros de corrupção, falsidade ou traição; poucos discutem ideias, programas ou resultados. É o retrato de uma política que perdeu a dimensão pedagógica e se converteu em espetáculo. A retórica substitui a razão, e a desconfiança se espalha como poeira sobre o espelho da democracia.

A imprensa, em parte, reflete essa mesma lógica. Corre atrás da manchete, reproduz as disputas e, muitas vezes, esquece o essencial: a prestação de contas à sociedade. A política, por sua vez, tornou-se autorreferente. Em vez de olhar o cidadão, olha-se no espelho — e vê-se apenas a própria imagem. As redes sociais amplificam o ruído: multiplicam-se opiniões, mas diminuem as escutas. O diálogo, esse instrumento civilizatório, é o que mais faz falta.

O eleitor, cansado, observa. Entre a descrença e o dever, mantém o voto como última forma de esperança. E é justamente nesse gesto silencioso que ainda reside o poder de mudar o enredo. Porque a política, para além dos partidos e das famílias que se revezam no poder, deveria ser um instrumento de transformação e serviço público — não um meio de perpetuação.

A reeleição automática, disfarçada de continuidade administrativa, tornou-se um vício da democracia. Mantém no cargo quem se acostumou à máquina, mas pouco inova, pouco arrisca. O desafio, agora, é reconstruir a confiança. Que o eleitor de 2026 não se deixe guiar por sobrenomes nem por sorrisos ensaiados, mas por resultados verificáveis, por trajetórias éticas e por compromissos com o bem comum.

O que a Paraíba precisa talvez não seja de novos discursos, mas de uma nova consciência pública — aquela que entende que cidadania não se exerce apenas nas urnas, mas na cobrança cotidiana. O povo não pode continuar como espectador de um espetáculo que se repete em quatro atos, a cada quatro anos.

Quando o eleitor olhar de frente esse espelho e enxergar além da maquiagem política, talvez reencontre o sentido de pertencimento. A Paraíba não precisa ser cenário: precisa ser casa — viva, justa e habitada por todos. Só então o silêncio deixará de ser omissão e voltará a ser pausa: a respiração necessária antes de um novo começo.

 

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