PENSAMENTO PLURAL Escolhas perigosas, por Palmarí de Lucena
Em sua crônica “Escolas perigosas”, o escritor Palmarí de Lucena volta a tratar da pauta do momento, o coronavírus. Palmarí aborda a questão do contraponto entre os que defendem o isolamento social e aqueles que pregam o retorno ao trabalho, e faz um questionamento no mínimo perturbador sobre “quantas pessoas estaríamos preparados a sacrificar, em beneficio de um retorno a atividade econômica”. Confira a íntegra de seu comentário…
Enfermeiro devidamente paramentado em uniforme verde hospitalar, posicionado corajosamente em um cruzamento confrontando uma carreata demandando o fim do isolamento social e abertura da economia. Apesar de acontecimento ter sido em Denver, o incidente expôs as tensões e o encruzilhada moral confrontando a humanidade. Duas opções incomodas: abrir a economia para ajudar a maioria ou proteger vidas de pessoas vulneráveis mantendo o isolamento social.
Adotada por conservadores e negacionistas do coronavírus, uma resposta baseada no utilitarismo, ou seja, deixar que a minoria sofra para a maioria beneficiar-se. Maneira comum e discutível de exercer escolhas morais, o utilitarismo estrito é uma das formas mais perigosas de tratar de questões de vida e morte.
Igualmente, nem todos opositores do distanciamento social ou outras medidas sanitárias restritivas são adeptos do utilitarismo, seus argumentos se baseiam em posições ideológicas extremas, viés religioso ou fadiga com instituições democráticas. Muitos deles misturam demandas pelo fechamento de tribunais superiores, dissolução do poder legislativo e a tomada do poder por forças castrenses, enquanto exigem a restauração de diretos constitucionais, supostamente violados por medidas sanitárias contra a propagação do COVID-19, como aconteceu recentemente no Brasil.
Pressões para abrir a economia como contraponto a constatação cientifica, implicam que podemos realizar uma análise de custo/beneficio sobre quantas pessoas estaríamos preparados a sacrificar, em beneficio de um retorno a atividade econômica. Beneficio que não seria distribuído equitativamente devido o COVID-19 atingir desproporcionalmente pobres, minorias e idosos, em relação a população do País.
Devemos expor inconsistência moral na escolha que algumas vidas merecem mais cuidados, enquanto abandonamos outros pelo bem da maioria da população. O embrião humano é considerado sagrado, assim é toda vida, incluindo vidas tornando-se mais vulneráveis se reabrimos a economia, sem achatarmos a curva da pandemia.