PENSAMENTO PLURAL Indulto como plataforma é desvio de poder, por Palmarí de Lucena

O escritor Palmarí de Lucena alerta, em seu texto, para o uso político de indultos e perdões como promessa eleitoral na disputa presidencial de 2026, classificando essa prática como desvio de finalidade constitucional. Defende que clemência não é política pública e que oferecer indulto em campanha equivale a institucionalizar a impunidade. O texto sustenta que transformar o perdão em moeda política corrói o Estado de Direito, fragiliza a confiança nas instituições e impõe ao eleitor o dever cívico de rejeitar candidaturas que prometem governar acima da lei. Confira íntegra...

A Constituição não prevê campanhas eleitorais organizadas em torno da promessa de perdão. Indulto não é programa de governo, não é agenda pública e não é bandeira legítima de campanha. Quando um candidato à Presidência anuncia perdões antecipados como promessa política, ele não está exercendo prerrogativa constitucional — está corrompendo-a.

O indulto não é instrumento de disputa eleitoral.
É exceção jurídica.

Transformá-lo em promessa de palanque é distorcer sua natureza e subverter sua finalidade. Ao anunciar, antes mesmo de governar, que usará o poder de perdoar para proteger grupos, aliados ou correntes ideológicas, o candidato assume publicamente que governará a partir da conveniência política — não do interesse público.

Isso não é democracia.
É personalismo.

A Constituição concede ao presidente a faculdade de conceder indultos para corrigir injustiças, não para fabricar impunidades. Quando o perdão passa a ser oferecido como aceno eleitoral, perde-se o caráter humanitário e instala-se uma lógica clientelista: votos em troca de esquecimento penal.

O Brasil já experimentou, em passado recente, o uso político da clemência presidencial como forma de tensionar instituições, desprezar decisões judiciais e oferecer blindagem simbólica a ilegalidades. O Supremo Tribunal Federal foi claro: o poder existe, mas não é absoluto. Quando há desvio de finalidade, há ilegalidade. E o discurso eleitoral que antecipa perdões é a mais explícita confissão de intenção desviada.

O paralelo internacional reforça o alerta. Em sistemas democráticos sólidos, o abuso do perdão presidencial provocou crises institucionais, corrosão da confiança pública e sensação de Justiça seletiva. O efeito é sempre o mesmo: descrédito no Estado de Direito.

Às vésperas da eleição de 2026, cabe ao eleitor rejeitar, sem ambiguidades, candidatos que apresentam clemência como moeda política. O voto que tolera promessa de indulto como política pública está assinando um cheque em branco para a impunidade.

Clemência não pode ser slogan.
Perdão não pode ser plataforma.
Indulto não pode ser promessa.

Quem promete anistiar antes de governar já anuncia como pretende governar: acima da lei.

A eleição presidencial não é escolha de xerife nem de salvador. É escolha de guardião da Constituição. A sociedade que aceita governantes dispostos a usar o perdão como favor pessoal caminha, lentamente, para fora da República.

Não se trata de ideologia.
Trata-se de legalidade.

Não se trata de partido.
Trata-se de princípios.

Em 2026, o Brasil estará diante de uma decisão que não admite neutralidade cívica: ou reafirma que ninguém governa acima das leis ou aceita que o poder sirva como escudo para seletividades.

Indulto como plataforma não é política pública.
É confissão de desvio de caráter institucional.

E democracias não sobrevivem quando o eleitor troca Constituição por conveniência.

 

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