PENSAMENTO PLURAL Não olhe para cima – o filme, por Rui Leitão
Em sua crônica, o escritor e historiador Rui Leitão aborda um dos mais recentes sucessos de Hollywood, o filme “Não olha para cima”, com Leonardo de Capri, uma sátira da realidade atual, atacando, especialmente, os negacionistas, “em razão do contágio de cegueira intelectual de que foram acometidos, teimam em não admitir as verdades inquestionáveis que a ciência tem nos oferecido”, diante de um cometa que está na iminência de colidir com a terra e exterminar a vida no planeta. Confira íntegra do texto…
Duvido que os negacionistas brasileiros contemporâneos consigam perceber as oportunas mensagens contidas no filme NÃO OLHE PARA CIMA, de Adam McKay. E os que perceberem se recusam a aceitar as sátiras e críticas muito bem elaboradas, nele colocadas. Os negacionistas, em razão do contágio de cegueira intelectual de que foram acometidos, teimam em não admitir as verdades inquestionáveis que a ciência tem nos oferecido. Um advogado, amigo meu, tentando justificar seu comportamento negacionista, me perguntou: mas, afinal de contas, o que é a ciência? A medicina pode ser considerada uma ciência? Lógico que nem me dei ao trabalho de responder tão absurda e estapafúrdia interrogação.
O filme aborda com absoluta maestria o estágio de ignorância a que parte da sociedade está se adaptando. Essa trágica comédia expõe como as pessoas, estimuladas por lideranças com posições políticas ou econômicas no exercício do poder, ousam questionar o que nos ensina a ciência quando apresenta fatos que não se permitem serem refutados. É natural que existam sempre opiniões contrárias e favoráveis sobre tudo que mereça um debate. Porém, insistir no negacionismo científico, apenas por uma motivação ideológica é, antes de qualquer coisa, uma atitude que beira à irracionalidade.
Mas, voltemos ao filme. Ele mostra o quanto as pessoas se dedicam a determinado ativismo político, sem conhecimento de causa, movidas por interesses pessoais ou de grupos. A oportunidade de alcançar a fama e o poder, influenciando comportamentos, moldando o caráter de alguns, encantados pela possibilidade de obter privilégios que são destinados às elites. A semelhança com a realidade que estamos vivendo não deve ser apenas uma coincidência. É, sem dúvidas, propositadamente uma crítica inteligente aos que acham que a ignorância é uma benção, quando pode ser útil a proveitos políticos.
É uma proposta reflexiva que agride os que se negam a enxergar o óbvio e se encaminham com vendas nos olhos para saltar no abismo. É uma advertência para aqueles que rejeitam observar a realidade das coisas, principalmente no campo político e social, com manifestações de pensamentos flagrantemente incoerentes e nocivos a si próprios.
A parte mais interessante do filme, é quando, no final, vemos dois comícios distintos. Um liderado pela presidente dos Estados Unidos, buscando convencer os americanos de que o meteoro não é uma ameaça, porque tudo está sob controle. Algo muito parecido com a forma como está sendo tratada a pandemia do coronavirus em nosso país. E, do outro lado, os cientistas querendo levar a verdade para o povo, como forma de adverti-los do perigo iminente.
O filme, portanto, tem causado grande alvoroço. Ele põe o dedo na ferida de forma contundente e verdadeira, dialogando com os tempos atuais. Vale a pena assistir.
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