Em sem comentário, o professor Emir Candeia traz um tema da atualidade, em função dos avanços tecnológicos que levaram ao desenvolvimento de autômatos, como robôs sexuais e bebês reborns, que são apresentados para compensar o vazio na vida de muitas pessoas, com a oferta de uma felicidade absolutamente artificial. “São respostas concretas a uma demanda crescente: relações sem conflito”, diz o autor. Confira íntegra…
Vivemos em um mundo , onde o tempo é escasso e o afeto anda fragilizado, surgem alternativas tecnológicas que prometem preencher nossas carências sem exigir esforço, frustração ou entrega verdadeira. Robôs sexuais e bebês Reborn não são apenas curiosidades do futuro — são respostas concretas a uma demanda crescente: relações sem conflito.
Mas o que essa busca revela sobre nós? Estamos evoluindo emocionalmente ou apenas fugindo da parte incômoda do amor humano?
Robôs sexuais: prazer sob controle total
Com aparência realista, inteligência artificial e programação emocional, os robôs sexuais prometem o “relacionamento perfeito”: sem rejeição, sem ciúmes, sem cobranças. O usuário escolhe a aparência, a voz, os gostos, e até o comportamento da máquina. É como criar um parceiro sob medida — uma espécie de “menu afetivo”.
Será que amar é mesmo desejar controle total sobre o outro? Ou o verdadeiro afeto nasce justamente da alteridade, da surpresa, da fricção?
Relacionar-se com um robô é confortável — mas é também estéril. Não há risco, mas também não há verdade.
O humorista e pensador Chico Anysio sintetizou bem esse contraste quando disse: “O sexo é uma coisa que passa, pode ser comprado e pode ser descartado; o amor é uma coisa que fica, não se compra, se conquista — e é eterno.”
Ao tentar substituir o amor por uma experiência sexual programável, podemos estar abrindo mão daquilo que permanece em nome daquilo que apenas distrai.
Bebês Reborn: maternidade sem o peso da realidade
Os bebês Reborn são bonecos hiper-realistas, feitos com tamanho, peso e aparência de recém-nascidos. Alguns têm batimentos cardíacos simulados, outros se mexem ou emitem sons. Para quem os adquire, oferecem a sensação de cuidado, presença e até consolo — sem as demandas, choros, fraldas e imprevisibilidades de um bebê real.
Muitos consumidores relatam alívio emocional, especialmente mães que perderam filhos ou pessoas solitárias. Isso merece respeito. Mas também impõe um alerta: até que ponto estamos substituindo vínculos reais por simulações emocionais? E se o afeto puder ser vivido apenas com bonecos — o que sobra da nossa necessidade de convivência, esforço e reciprocidade?
O risco do afeto sob demanda
Queremos o amor sem o trabalho do amor. Desejamos companhia sem incômodo, cuidado sem esforço, prazer sem rejeição. Mas isso não é afeto — é consumo. E o consumo, por definição, é descartável.
Afeto verdadeiro exige vulnerabilidade. Você só se sente amado de verdade quando corre o risco de não ser amado de volta. Um robô ou um bebê Reborn jamais vai decepcionar — mas também jamais vai amar. Porque só quem tem liberdade de dizer “não” pode dar um “sim” que valha algo.
Essas tecnologias respondem a uma dor real: solidão, luto, frustração amorosa, relações cada vez mais frágeis. Mas oferecem uma solução artificial: uma convivência programada, livre de riscos — e, por isso mesmo, livre de verdade.
Podemos criar robôs perfeitos. Mas não podemos fabricar amor.
Conclusão: queremos companhia ou apenas conforto emocional?
Robôs sexuais e bebês Reborn não são apenas produtos. São sintomas de uma época em que até os sentimentos foram automatizados. A pergunta que fica é: queremos relações humanas — com tudo que isso envolve de dor e alegria — ou queremos apenas a ilusão de estar acompanhados, sem o risco de sermos rejeitados?
Como diria Chico Anysio, o sexo pode ser comprado e descartado — o amor, não. E é talvez por isso que o amor ainda continua sendo o maior desafio da humanidade, mesmo em tempos de inteligência artificial.
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