PENSAMENTO PLURAL O estado de barbárie se instalando, por Rui Leitão

“Estamos mergulhadores num estado de barbárie”, é como inicia sua crônica o escritor e historiador Rui Leitão, denunciando uma dose imensa de irracionalidade no comportamento dos indivíduos, com potencial para comprometer a harmonia da sociedade. E ainda, de forma ainda mais sombria: “Desponta no horizonte um período de guerras morais (ou de falsa moralidade), estimulando desavenças, agressões e ofensas.”. Confira a íntegra de seu comentário.

Estamos mergulhando num estado de barbárie. E isso é apavorante. Vivemos a desumanização das relações pessoais. Surge a violência social. O espaço de reflexão na política torna-se cada vez mais exíguo. Somos desafiados a encontrar novas formas válidas de sociabilidade. A irracionalidade se aprofunda nos comportamentos individuais comprometendo a harmonia coletiva. Desponta no horizonte um período de guerras morais (ou de falsa moralidade), estimulando desavenças, agressões e ofensas.

Quem se propõe ter a civilidade como código de postura está sendo marginalizado. Torna-se alguém fora do contexto e vulnerável a ataques dos fanáticos e fica tolhido na sua capacidade de pensar e de se expressar. As forças democráticas e progressistas da sociedade entram em clima de pânico e espanto. A lógica da repressão começa a recrudescer.  As divergências inaceitáveis. Findam-se os diálogos e nascem os confrontos discursivos que estão produzindo, em consequência, as agressões físicas. Estabelece-se a tensão social e política.

Segundo Bertrand Russel “o mal neste mundo é que os estúpidos vivem cheios de si e os inteligentes cheios de dúvidas”. Ora, a dúvida é que permite o pensar que pode levar ao bom senso. Quando nos imaginamos donos absolutos da verdade, nos transformamos em indivíduos que não aceitam o contraditório, as diferenças de opinião e de ideias. Aí nasce o radicalismo que se apresenta como um passo para a barbárie.

O discurso do ódio e do preconceito estimula a violência. A barbárie é produto da apologia à tortura, à hostilidade, à discriminação, à cultura armamentista. Perplexos vemos pessoas ordeiras, de repente, aplaudindo essas mensagens carregadas de ira e de sede de vingança.  A presunção de que se deva  combater a violência com mais violência. Procura-se convencer os incautos a aderirem à necessidade de uma autoridade política forte e despótica para resolver nossas crises contemporâneas.  A população é incitada a práticas fascistas tais como o uso da força, o linchamento, o armamento, a pena de morte, a xenofobia, a homofobia, a misoginia, etc. Atitudes autoritárias servem para a identificação de “mitos”.

Estamos, portanto, vivenciando uma situação de insegurança excepcional, construída na propagação do medo, real ou imaginário. Inverte-se, intencionalmente, o conceito de moralidade, naturalizando as ações violentas como remédio para a superação da nossa instabilidade política. Fortalecem a ideologia da guerra contra o “inimigo interno”, muito próximo da doutrina de segurança nacional adotada pela ditadura militar. Prevalece aquela velha história de que os fins justificam os meios. Que Deus nos proteja.

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