PENSAMENTO PLURAL O poder à prova da democracia, por Palmarí de Lucena

Em seu comentário, o escritor Palmarí de Lucena reflete sobre as recentes eleições na América Latina que, apesar de evidenciarem uma consolidação da democracia na região, ainda “persistem tentativas de enfraquecer instituições, prolongar mandatos e contestar resultados eleitorais”. Confira íntegra…

Na América Latina, as eleições se consolidaram, mas persistem tentativas de enfraquecer instituições, prolongar mandatos e contestar resultados eleitorais. A obstrução da alternância do poder permanece como um dos maiores riscos à estabilidade política.

Outro problema é a instrumentalização do Legislativo. Emendas parlamentares usadas como moeda de troca e a “porta giratória” entre Congresso e Executivo comprometem a independência entre os poderes, transformando o Parlamento em extensão do governo e alimentando a desconfiança social.

Também cresce a retórica contra o Judiciário. Processos por corrupção, abuso de autoridade ou crimes contra a ordem democrática são frequentemente descritos como perseguição política. Esse discurso pode mobilizar bases de apoio, mas enfraquece a legitimidade das instituições de controle e ameaça o próprio Estado de Direito.

O Uruguai aparece como exceção. A sucessão ocorre sem crises, ex-presidentes não enfrentam processos e a cultura política de austeridade fortalece a confiança institucional. Esse contraste mostra que estabilidade democrática não depende apenas de eleições, mas de práticas que valorizem limites ao poder e reduzam a personalização da política.

Em muitos países, porém, líderes acusados de crimes contra o Estado de Direito adotam como estratégia atacar tribunais e parlamentos, convertendo sua defesa em narrativa política. Tal prática pode garantir sobrevida imediata, mas corrói a confiança nas instituições e transforma disputas pessoais em ameaça coletiva.

O desafio regional é fortalecer mecanismos de fiscalização e preservar a alternância de poder, sem que cada processo judicial se torne combustível para a retórica da perseguição. O futuro democrático da América Latina dependerá menos da queda de líderes e mais da integridade das regras que garantem a convivência democrática.

 

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