O texto do escritor Palmarí de Lucena critica a paralisia e o viés político do Conselho de Ética da Câmara, que arquiva ou adia processos de forma seletiva. Casos como os de Carla Zambelli, Eduardo Bolsonaro e André Janones revelam um órgão complacente e uma Mesa Diretora omissa. Defende-se a criação de prazos fixos, sanções graduais e transparência, para que o Parlamento recupere a autoridade moral que perdeu diante da sociedade. Confira íntegra…
O Conselho de Ética da Câmara dos Deputados deveria ser o guardião da integridade parlamentar, mas sua atuação recente revela um órgão vulnerável à conveniência política. Casos como os de Carla Zambelli, Eduardo Bolsonaro e André Janones tornaram-se símbolos de um padrão recorrente: demora, arquivamento e silêncio — mesmo diante de condenações judiciais ou condutas contrárias ao decoro.
Em 2023, o Conselho arquivou, por 15 votos a 4, o processo contra Zambelli, acusada de insultar o deputado Duarte Júnior. Dois anos depois, abriu processo contra Eduardo Bolsonaro, acusado de atacar instituições democráticas. O relator apresentou parecer pelo arquivamento, e a votação foi adiada — expediente que transforma o tempo em aliado da impunidade.
Mais recentemente, o deputado André Janones passou a ser investigado por “rachadinha”. Apesar das evidências apresentadas pelo Ministério Público, o Conselho conduz o caso com lentidão e sucessivas prorrogações. A diferença de tratamento é evidente: enquanto casos semelhantes já levaram à cassação de mandatos, o colegiado atual calcula cada gesto conforme o peso político do acusado.
Outros episódios reforçam a seletividade. Abílio Brunini foi acusado de ofensas reiteradas sem punição efetiva; Nikolas Ferreira, condenado por discriminação, segue em comissões estratégicas; e o caso de Henrique Vieira foi arquivado após pressão pública. A ética, na Câmara, oscila conforme as maiorias.
Mesmo quando há condenações judiciais, o Conselho costuma alegar aguardar o trânsito em julgado. Essa omissão cria um abismo entre o que é legal e o que é moral. O decoro não depende de sentença penal: é conduta pública, respeito ao mandato e à sociedade. O resultado é devastador — enquanto o Judiciário pune, o Legislativo se cala.
A Mesa Diretora limita-se a encaminhar representações, sem garantir prazos nem curso regular dos processos. O Conselho, reflexo da correlação de forças da Casa, age com complacência quando o investigado tem influência política. Assim, o Parlamento pune pouco, tarde e de forma desigual.
É preciso romper esse ciclo. O Conselho deve adotar prazos fixos e inadiáveis, impedir o uso da morosidade como estratégia e criar sanções intermediárias — advertências, multas e suspensões. Transparência também é essencial: relatórios anuais e portais de acompanhamento público permitiriam à sociedade fiscalizar quem fiscaliza.
Por fim, é urgente que o Conselho atue de ofício diante de condenações judiciais. A ética política deve ser complementar, não subordinada à Justiça. Um Parlamento que ignora sentenças e arquiva evidências perde autoridade moral para legislar sobre moralidade pública.
A integridade das instituições não se preserva por conveniência, mas por coerência. Reformar o Conselho de Ética é restaurar a credibilidade do Legislativo e reafirmar que ética não é ornamento — é a linha que separa a política da desfaçatez.
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