Em seu comentário, o professor Emir Candeia reflete como o que deu certo no passado nem sempre dará no futuro, e e lembra: “O “presente” que o Governo dá aos excluídos não ajuda em nada na construção do seu futuro.” E ainda: “Esquerda ou direita, quando se apegam mais aos mitos fundadores do que às necessidades reais da população atual, tornam-se incapazes de dialogar com as novas gerações.” Confira íntegra…
A célebre frase de Marshall Goldsmith — “O que levou você até aqui não é o que o levará até lá” — sintetiza um dilema enfrentado por empresas, universidades, hospitais, clubes esportivos e até movimentos políticos: o apego ao passado como justificativa para a estagnação presente. O sucesso de ontem pode virar armadilha se for tratado como fórmula perpétua. O mundo muda, os desafios evoluem, e o que antes era excelência, hoje pode ser apenas obsolescência.
O retrovisor é referência, não caminho
Olhar para o retrovisor é importante para entender de onde viemos, mas guiar-se por ele é suicídio estratégico. Muitas organizações caem na tentação de se apegar ao que funcionou antes — processos, estruturas, slogans, nomes consagrados — ignorando que a paisagem atual exige novas rotas, novos veículos e, muitas vezes, novos motoristas. O resultado? Ficam paradas no tempo enquanto o mundo as ultrapassa.
Universidades: o conhecimento que não se atualiza
Algumas universidades ainda operam como nos anos 90: grades curriculares engessadas, metodologias antiquadas e resistência à interdisciplinaridade. O conhecimento hoje é dinâmico, acessível e descentralizado. Quando uma instituição de ensino se recusa a desapegar do modelo tradicional, ela deixa de formar pensadores e passa a produzir repetidores de fórmulas ultrapassadas. O prestígio de um passado acadêmico respeitável não basta se o aluno de hoje sair despreparado para o mercado do amanhã.
Hospitais e Centros de Saúde: tecnologia sem mentalidade atualizada
Hospitais que foram referência em décadas passadas muitas vezes mantêm uma estrutura de poder vertical, protocolos desatualizados e resistência à integração de novas tecnologias, como inteligência artificial e prontuários eletrônicos. O resultado é um atendimento burocrático, caro e ineficiente. A medicina avança, mas o mindset de alguns gestores ainda está preso ao “sempre fizemos assim”.
Empresas e lojas comerciais: o Caso Kodak e outros tantos
A Kodak foi líder mundial em fotografia, mas ignorou a revolução digital. Preferiu proteger seu modelo lucrativo de filmes fotográficos e acabou engolida pela inovação que ela mesma ajudou a criar. O mesmo se aplica a lojas físicas que resistem ao e-commerce, à digitalização do atendimento e à personalização do consumo. A arrogância de quem já brilhou pode ser o veneno que mata lentamente a relevância.
Times de futebol: títulos não vencem partidas futuras
Clubes com grandes histórias e camisas pesadas, como o Treze Futebol Clube, o Corinthians e o Vasco, enfrentam dificuldades por não se adaptarem ao futebol moderno. O Treze, por exemplo, com forte tradição no Nordeste e paixão de sua torcida, viu sua performance e gestão patinarem por anos. O Corinthians, mesmo com uma das maiores torcidas do Brasil e conquistas expressivas, passou por crises internas, endividamento e falta de planejamento a longo prazo. O resultado é claro: demora em modernizar suas gestões, insistência em modelos falidos de contratação e resistência a métodos de análise de desempenho. No futebol, como na vida, o placar que importa é o do jogo de hoje.
Teses políticas: ideias vitoriosas podem virar dogmas
Movimentos políticos que alcançaram conquistas no passado, mas recusam-se a adaptar sua narrativa à realidade presente, tendem a perder relevância. Se tornam caricaturas de si mesmos. Um exemplo claro é a manutenção de ideias e programas políticos que, embora tenham sido soluções eficazes em contextos históricos específicos, hoje estão ultrapassados. Modelos estatais centralizadores, discursos populistas ou políticas econômicas protecionistas podem ter sido úteis em períodos de reconstrução ou repressão externa, mas tornaram-se entraves em tempos de economia digital, sociedade em rede e globalização. Tentar aplicar “a receita de 1950 para curar a doença de 2025” é negar o presente e comprometer o futuro. Esquerda ou direita, quando se apegam mais aos mitos fundadores do que às necessidades reais da população atual, tornam-se incapazes de dialogar com as novas gerações. O mundo muda, a linguagem muda, os desafios mudam — e a política que não acompanha esses movimentos vira peça de museu.
A solução: humildade intelectual e reaprender sempre
A chave está na humildade intelectual: entender que ninguém sabe tudo, que toda experiência é limitada, e que cada contexto exige novas habilidades. Isso vale para o CEO, o reitor, o técnico de futebol, o diretor de hospital ou o líder partidário. O mundo está cada vez mais complexo, e quem insiste em repetir padrões sem revisar o cenário se condena à irrelevância.
Conclusão
Glórias do passado são como diplomas emoldurados na parede: honrosos, mas incapazes de resolver os problemas do presente. Toda entidade que deseja continuar relevante precisa revisar sua trajetória com espírito crítico, desapegar de hábitos antigos e cultivar a coragem de mudar. O sucesso futuro é reservado aos que evoluem — não aos que apenas lembram do quanto já foram grandes.
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