PENSAMENTO PLURAL Os erros da cloro-politica, por Palmarí de Lucena
Em sua crônica, o escritor Palmarí de Lucena avalia que as as ações do governo Bolsonaro, ao longo de 2020, em vez de adotar medidas mais claras de combate à Covid, adotando iniciativas pela compra de imunizantes, “limitaram-se a apenas pedidos vagos de informações sobre o desenvolvimento de vacinas, sem demonstrar grande interesse na compra de imunizantes sendo produzidos”. Confira íntegra do seu texto…
Embora não sejam acusados como agentes ativos de atos ilícitos, a atitude de cegueira deliberada e tentativas de negação plausível de membros e ex-membros do Poder Executivo e Congresso Nacional, sugere a existência de fortes indícios de negligência benigna, como também a proposital manipulação político-ideológica de certos aspectos do combate a pandemia, em especial as medidas sanitárias complementares. Revelações que expõem um preocupante padrão de conversa dupla e ausência de devida diligência na escolha de imunizantes e obtenção de insumos médico-hospitalares.
Decisões inadequadas baseadas em evidências anedóticas, ignoraram a considerável ambiguidade de dados disponíveis sobre imunidade de rebanho ou da maneira que foram interpretados. Em vez de adquirir estoques de vacinas e promover medidas sanitárias, a “cloro-política” do Governo favoreceu iniciativas diplomáticas e investimentos na promoção de hidroxicloroquina e cloroquina para o tratamento precoce da covid-19, mesmo após a OMS ter interrompido testes clínicos com as drogas e associações médicas terem alertado para a ineficácia e o risco de efeitos colaterais.
Durante a marcha da pandemia, observou-se a gradual e profunda lapidação de funções e capacidades técnicas do Ministério da Saúde. O Laboratório do Exército transformou-se no principal fornecedor de milhões de comprimidos da cloroquina; o Ministério de Relações Exteriores mobilizou o aparato diplomático brasileiro na busca da droga mundo afora, alegando que o Brasil havia sucedido em provar sua eficácia, sem apresentar evidência científica sobre “os testes bem sucedidos “ em hospitais brasileiros ou estudo considerado padrão ouro (randomizado, duplo-cego e com grupo de controle), que demonstrasse a eficácia da cloroquina no tratamento precoce da covid-19.
Ações do Governo Federal em 2020, limitaram-se a apenas pedidos vagos de informações sobre o desenvolvimento de vacinas, sem demonstrar grande interesse na compra de imunizantes sendo produzidos. Driblando a falta de apoio do Ministério da Saúde e do Itamaraty, o Estado de São Paulo e o Instituto Butantã conseguiram formar uma parceria com a gigante farmacêutica chinesa Sinopharm, para a fabricação nacional do imunizante Coronavac, que hoje representa mais de 80% das doses administradas no Brasil, com muita aceitação do público vacinável.
Lamentavelmente, as contribuições de membros do Poder Executivo limitaram-se a pronunciamentos negativos sobre o produto chinês e, em alguns casos, caracterizações ofensivas e preconceituosas contra o povo chinês. Tendência que continua ressurgindo nos mais altos escalões do Governo, com a sutileza do odor sulfúrico de um gêiser imprevisível e perigoso. O novo mantra do Governo: vacinas, vacinas, vacinas é anunciado ad nauseam, sem uma separação clara das políticas que nos levaram a situação em que chegamos, quando transformamos uma emergência sanitária em uma tragédia nacional de consequências imprevisíveis.
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