Em seu comentário, o professor Emir Candeia reflete sobre a relação de políticos com o Estado, ao indagar se político pode ou não ter empresa. E responde: “Sim, pode. O que a lei proíbe é que ele seja administrador direto da empresa durante o mandato e, sobretudo, que use o cargo público para favorecer seus negócios privados.” Confira íntegra…
Empresa não é crime. Tráfico de influência, sim. A recente notícia de que Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, lançou sua própria marca de smartphones e uma empresa de telefonia — a Trump Mobile — reacendeu um debate essencial também para o Brasil: o agente público pode ser empresário?
Sim, pode. O que a lei proíbe é que ele seja administrador direto da empresa durante o mandato e, sobretudo, que use o cargo público para favorecer seus negócios privados. Quando isso acontece, o nome é claro: tráfico de influência. É crime — aqui, nos EUA ou em qualquer democracia séria.
Para entender melhor, vale olhar o contraste entre dois nomes da política brasileira recente: Fernando Haddad e Paulo Guedes.
Haddad, atual ministro da Fazenda, tem trajetória inteiramente ligada à vida pública e à academia. Nunca empreendeu no setor privado. Viveu da política, foi ministro da Educação, prefeito de São Paulo e candidato à presidência. Até hoje, não há registro de qualquer investimento produtivo com capital próprio. É um quadro técnico, sim, mas vive exclusivamente da estrutura pública, da cátedra ao gabinete.
Guedes, por outro lado, antes de assumir o Ministério da Economia no governo Bolsonaro, construiu uma sólida carreira no setor financeiro. Fundador do Banco Pactual e de outras iniciativas no mercado de capitais, já era um empresário consolidado antes de entrar na política. Pode-se criticar sua gestão, mas o fato é que ele entrou no governo depois de enriquecer com o próprio trabalho, não o contrário.
A diferença entre os dois é simbólica. Haddad representa o político típico brasileiro: vive da máquina e para a máquina. Já Guedes mostra um exemplo de quem passou a maior parte da vida gerando riqueza fora do Estado e só depois foi para o governo, com know-how e patrimônio próprios.
No Brasil, infelizmente, a maioria dos políticos segue a linha Haddad — mas sem o preparo técnico que ele tem. São pessoas que nunca investiram um centavo fora da política, que usam o poder para empregar familiares, fazer lobby disfarçado e garantir conforto pessoal às custas do erário. Vivem exclusivamente da influência que detêm. Política, para eles, é negócio de sobrevivência.
Por isso, é preciso reafirmar: ter empresa não é crime. Ao contrário, é um dever de quem pode investir. O problema é usar o cargo público para alavancar interesses privados.
Foi por respeitar essa linha ética que nomes como o ex-governador José Maranhão deixaram um legado honrado. Maranhão empreendeu durante toda a vida, mas sem jamais usar o poder do Estado para favorecer a si mesmo ou a sua família. O mesmo não se pode dizer de muitos outros.
Está mais do que na hora de o Brasil valorizar políticos que chegam ao poder com história de trabalho fora da máquina pública — e punir com rigor aqueles que fazem da política um atalho para o enriquecimento pessoal. O Estado não é herança nem trampolim. O político que se comporta como empresário do poder público não é empreendedor — é oportunista.
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