O tratamento dos emigrantes brasileiros, especialmente deportados dos EUA, “revela um cenário de políticas migratórias restritivas e desumanas”. É o que observa o escritor Palmarí de Lucena, em sua mais recente crônica, e ainda: “A utilização de algemas e a postura cautelosa dos governos, incluindo o de Bolsonaro, refletem as dificuldades da diáspora brasileira, que continua a contribuir para a economia nacional, apesar dos desafios enfrentados.” Confira íntegra…
Em 2021, as autoridades dos Estados Unidos anunciaram que começariam a utilizar algemas nos brasileiros deportados durante os voos de repatriação. Embora a justificativa fosse uma questão de segurança, a medida gerou controvérsias, sendo vista por muitos como uma violação dos direitos humanos e uma forma de desumanização. Esses deportados, que já enfrentavam dificuldades devido à sua situação irregular, viram o uso de algemas como um agravante desnecessário.
Este episódio reflete um contexto mais amplo das transformações nos fluxos migratórios brasileiros. Desde a década de 1980, o Brasil, tradicionalmente um país receptor de imigrantes, se consolidou como um importante país de origem de emigrantes. A estagnação econômica, a insegurança e o desemprego, aliados à facilidade de transporte e ao acesso à informação, têm levado milhões de brasileiros a buscar novas oportunidades no exterior. A diáspora brasileira, atualmente com cerca de dois milhões de pessoas, enfrenta não apenas dificuldades de adaptação, mas também discriminação e políticas migratórias cada vez mais restritivas, especialmente nos Estados Unidos e na Europa.
Durante o governo de Donald Trump, a repressão aos imigrantes indocumentados se intensificou. Políticas como a separação de famílias e deportações em massa expuseram os imigrantes a condições precárias, aumentando sua vulnerabilidade. A postura do governo brasileiro, liderado por Jair Bolsonaro, foi cautelosa e evitou um confronto direto com os EUA. A retirada do Brasil do Pacto Global para a Migração da ONU, em 2019, alinhou ainda mais o país às políticas restritivas dos Estados Unidos, comprometendo a segurança dos emigrantes brasileiros.
No entanto, a postura do governo Lula, já em seu terceiro mandato, tem buscado uma abordagem mais ativa em relação aos direitos dos emigrantes brasileiros, com foco na proteção da dignidade e na busca por uma política migratória mais humanitária. O atual governo tem se mostrado mais atento às dificuldades enfrentadas pela diáspora brasileira, procurando reverter a postura mais passiva adotada anteriormente. No entanto, as políticas migratórias globais, especialmente as de países como os EUA, ainda representam um grande desafio para a proteção dos emigrantes.
Apesar de todos esses desafios, os emigrantes brasileiros continuam a desempenhar um papel fundamental na economia do Brasil. Entre 2010 e 2020, estima-se que os emigrantes enviaram cerca de US$ 26,4 bilhões para o país, representando aproximadamente 1% do PIB nacional. Os principais países de origem dessas remessas são os Estados Unidos, Japão e Portugal. As políticas migratórias rigorosas, no entanto, dificultam a permanência desses emigrantes e colocam em risco a continuidade das remessas, ao aumentar a insegurança nos países de acolhimento.
O uso de algemas nos deportados brasileiros é apenas a ponta do iceberg. A medida reflete um cenário global de políticas migratórias cada vez mais restritivas, que afetam especialmente populações vulneráveis, como os imigrantes brasileiros. A falta de apoio do governo brasileiro, combinada com a hostilidade das políticas externas, aumenta as tensões dentro da diáspora, forçando muitos imigrantes a retornar ao Brasil, onde enfrentam as mesmas dificuldades que os motivaram a emigrar.
O governo brasileiro, sob Lula, tem se empenhado mais em adotar uma postura de defesa dos direitos dos emigrantes brasileiros, buscando fortalecer a posição do país nas discussões internacionais sobre migração. Contudo, a resposta internacional a essas questões ainda é limitada, e o Brasil precisa continuar pressionando para garantir uma abordagem mais inclusiva e respeitosa dos direitos dos migrantes.
Em síntese, o episódio das algemas reflete um quadro maior de políticas migratórias restritivas e desumanas, que afetam a diáspora brasileira e outras populações vulneráveis. A proteção dos direitos dos emigrantes brasileiros exige uma reflexão crítica sobre a postura diplomática do Brasil e um compromisso com os direitos humanos em um contexto global de migração.
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