Por que prefiro Rosa aos espinhos de Joyce
Por três vezes tentei ler Ulysses, de James Joyce, e por três vezes fui derrotado. Foram semanas de suplício tentando entender a Odisseia de Leopold Bloom, o protagonista que é uma espécie de agente de publicidade. O livro todo retrata um dia na vida de Bloom, e há elementos de similitude com o Ulysses, da Odisséia de Homero.
Há também muitos elementos autobiográficos de Joyce, que lembram Stephen Dedalus, o personagem do livro Retrato do Artista Quando Jovem, que traz, de fato, muito da juventude de Joyce na Irlanda, onde era conhecido como um jovem muito arrogante. Dedalus chegou a flertar com a batina, mas recusou o convite para ser jesuíta e seguiu adiante sua própria odisseia.
Da mesma forma que ocorreu com Ulysses, também sofri para ler Guerra e Paz, de Leon Tolstói. Se bem que, atendendo ao conselho de Tolstói, fui ao final, segui da guerra à paz. Creio que me convenceu o prefácio, quando ele diz que seu livro é como quem escala uma montanha. O desafio é penoso, mas, uma vez lá em cima, a vista compensa todo o sacrifício. E realmente vale.
Mas, experiência nova eu tive mesmo foi com Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa. Várias vezes, eu tentei enveredar pelo universo criado por Rosa e, por várias vezes, sucumbi. Até que, certo dia, atendi ao conselho de uma amiga leitora também obstinada. Eu deveria simplesmente ler em voz alta. Inclusive descobri que, até a Idade Média, era comum as pessoas lerem em voz alta.
Funcionou com Guimarães Rosa. Graças ao recurso, pude enveredar pelo universo de neologismos, até entender que Rosa escrevera Grande Sertão como se falasse pela boca de um homem simples do Jequitinhonha, contando suas estórias e, claro, fazendo suas reflexões numa filosofia surpreendentemente simples. Rosa me conquistou. Em voz alta, em silêncio e, depois, escrevendo sobre ele.
Não há simplesmente como se falar em literatura brasileira sem destacar Guimarães Rosa. Tão genial quanto Joyce. Talvez até melhor. Como não consegui sobreviver ao espinhoso Ulysses, de Joyce, fico apenas com Rosa e seu maravilhoso universo, que é a radiografia de um Brasil fantástico e, por isto mesmo, tão realista. Um Brasil que todos deveriam conhecer.